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1 Apr 2025, Tue

Mads Mikkelsen faz o papel de vilão em filmes de 007 e Indiana Jones e num derivado de Harry Potter. Normal; para Hollywood, o estrangeiro é bandido, Mas, além disso, o ator dinamarquês tem a estampa ideal. É alto, forte, foi ginasta, fala com sotaque e mexe pouco o rosto pétreo.

Ele contou numa entrevista que, ao convidar um diretor estrangeiro, os executivos americanos insistem que querem seu “toque mágico”, a “visão única”. O forasteiro topa e, chegando lá, escuta: “Adoramos você, mas por favor mude totalmente, vire um de nós”.

O raciocínio vale também para atores. Por isso, os bons filmes de Mikkelsen foram feitos na Dinamarca, cujo cinema é dos mais criativos da Europa. Destacou-se na trilogia “Pusher”, ganhou algum renome com “Druk – Mais uma Rodada” e agora fulgura em “O Bastardo”.

O filme é tão bom que parece um romance. Passa-se nas brenhas dinamarquesas antes de a Revolução Francesa varrer a Europa. É um drama sombrio sobre racismo, batatas, cristianismo e, ora veja só, luta de classes. No caso, a luta de um burguês frugal e industrioso contra um nobre abjeto para levar o capitalismo a um meio inóspito.

O protagonista, um capitão de berço espúrio, lembra o Paulo Honório de “S. Bernardo”, de Graciliano Ramos. Empenhado na acumulação primitiva, arranca a pele do próximo, esfola a si mesmo e busca a redenção. Mikkelsen injeta-lhe alma, pesar, remorso –e o finca no árido solo social.

“O Bastardo” está passando só no Belas Artes. Lamentavelmente, a projeção medonha borra a paleta nuançada do filme.

Demi Moore centrou sua carreira no torso, um pouco no rosto e nada na crânio. O corpo é mais aeróbico que erótico, pois que retalhado pela edição ultrarrápida em filmes nos quais não cessa de malhar, com ênfase em “la derrière”. Sua face tem a expressividade de Barbie.

A mente deu as caras só agora, aos 60 anos, em “A Substância”, um filme desonesto do primeiro ao último fotograma. A mercantilização do corpo, à qual a atriz se aplicou de bom grado até ficar podre de rica, serve de matéria para uma denúncia prenhe de hipocrisia.

A atriz fica pelada em “A Substância” para dizer que a nudez a objetifica. Toma uma droga antivelhice para denunciar o etarismo. Diz que televisão é feita por porcos machistas, e lhes é de um servilismo abjeto. Mostra gente com as tripas do avesso para se opor aos padrões de beleza. Cita “Um Corpo que Cai” e “2001” sem nenhum propósito.

É sinal dos tempos que Demi Moore seja levada a sério e até tida por feminista –um mal sinal, porque o filme, asqueroso, é duro de assistir até o fim. Se “A Substância” tivesse uma mensagem, ela seria: as celebridades também sofrem.

Catherine Deneuve parece perdida em “Bernadette”, filme que conta os 12 anos em que a mulher de Jacques Chirac foi primeira-dama. Emperiquitada e escanteada, a madame original era cômica. Deneuve até tenta rir dela, mas as piadas não a ajudam, são chochas.

Do meio para fim, o filme abandona a graça sem graça e vira uma defesa vexatória de Bernadette –”féminisme oblige”. A atriz fica condescendente com a personagem e, o que é pior, consigo mesma. Pena. Aos 80 anos, ela tem talento e garra para fazer uma grande comédia.

Joaquin Phoenix se especializou em caricaturar personagens históricos até torná-los idiotas cheios de esgares, rompantes e risinhos maléficos. Cômodo, o imperador romano, e Bonaparte, o imperador corso, foram vítimas da sua sanha.

O personagem que o define, todavia, nunca teve nada de real; nasceu no papel barato de velhas histórias em quadrinhos do Batman: o Coringa. Joaquim Phoenix fez dele um tipo difícil de encarar, de tão desagradável, repulsivo mesmo.

No livro “O Pobre de Direita”, Jessé Souza diz que o Coringa é um símbolo da gente humilhada dia e noite, das massas ressentidas do século 21. Que seja um psicopata e assassine seis pessoas, inclusive a mãe, não apoquenta o sociólogo. Para ele, o baixinho Phoenix é “grande”.

“Coringa” abocanhou US$ 1 bilhão mundo afora e rendeu um Oscar para o ator. Como é óbvio, gerou uma sequência, “Coringa: Delírio a Dois”. O título é ótimo porque o ator, que não sabe cantar, faz duetos despropositados com Lady Gaga, que canta bem.

Com um enredo sem pé nem cabeça, o que resta ao espectador é aturar os estrepitosos trejeitos de Joaquin Phoenix. O grotesco chega ao ápice quando ele esgoela “That’s Entertainment!”. Dá até medo. Saudades de Judy Garland, que sabia direitinho o que é entretenimento.



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