Progressismo, tragédia latino-americana – 12/10/2024 – Samuel Pessôa

A queda do Muro de Berlim e o reconhecimento de que a economia de planejamento central não funcionou geraram nas esquerdas latino-americanas o progressismo.

Nesta coluna, entendo por progressismo não como o oposto do conservadorismo nos costumes, mas como a estratégia de parcelas da esquerda latino-americana de travar a luta de classes, neste novo mundo pós-queda do Muro, tensionando a economia de mercado.

O kirchnerismo representa uma versão democrática do progressismo, enquanto o chavismo representa uma versão autoritária. Há em comum entre ambas a busca por políticas macroeconômicas e microeconômicas que tentam reduzir a desigualdade à revelia do bom funcionamento da economia.

A justificativa é que “quem tem fome de pressa”. Essa bela frase de Betinho, infelizmente, na América Latina, não é boa companheira.

Ao testar os limites da economia, o progressismo sempre acaba em forte desorganização macroeconômica e em crise profunda. O resultado é o inverso do almejado. A terra arrasada produzida pelo progressismo agrava os problemas sociais e somente eleva o número de famintos com pressa.

No continente, a Concertación, que governou o Chile por duas décadas, é um exemplo de esquerda latino-americana não progressista, no sentido empregado nesta coluna.

No Brasil, tivemos uma versão não progressista do governo petista representada pelos três anos do ministro Palocci à frente da Fazenda.

Após o mensalão, o presidente Lula fez uma escolha, e os governos petistas abraçaram o progressismo.

O quadro abaixo representa a evolução das exportações líquidas acumuladas em quatro trimestres, como proporção do PIB a preços constantes de 1995. O dado foi construído a partir da série das contas nacionais trimestrais do IBGE.

É claríssima a insustentabilidade macroeconômica da política econômica entre 2006 e 2013. Em 2005, as exportações líquidas eram superavitárias em 4,3% do PIB. Em 2013, antes, portanto, da crise econômica, as exportações líquidas apontavam um déficit de 3,9% do PIB. Nos oito anos de 2006 até 2013, houve piora de 8,2 pontos percentuais! Se no período a economia cresceu 37%, a demanda doméstica cresceu 48%, excesso de 11 pontos percentuais. Tivemos o progressismo testando os limites da economia.

Nos últimos dois trimestres já temos uma leve piora de quase 0,4 ponto percentual. Com Lula 3, o progressismo voltou, apesar dos esforços do ministro Haddad.

O presidente Lula deseja criar uma alíquota adicional para todas as rendas declaradas para pessoas com renda total acima de R$ 1 milhão. É necessário sabermos os detalhes da medida, mas me parece correta do ponto de vista da equidade. A receita servirá para financiar a desoneração do IRPF para rendas de até R$ 5.000.

Somente no primeiro semestre a dívida pública elevou-se em 4,5% do PIB. Estamos a pleno emprego, período das vacas gordas. Era para a dívida pública cair. Não há, portanto, espaço fiscal para elevar o gasto tributário. Trata-se de medida eleitoreira visando 2026.


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