6 de 10 comarcas não têm audiência de custódia presencial – 11/11/2024 – Cotidiano

Mais de um ano após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que determina a realização de audiências de custódia em formato presencial, 6 em cada 10 locais que realizam esses procedimentos têm como regra o modelo misto ou totalmente virtual. Em metade das unidades, agentes de segurança sempre estão presentes ou ouvem o que é dito pelo custodiado.

Os dados fazem parte do novo levantamento da APT (Associação para a Prevenção da Tortura), que será divulgado nesta terça-feira (12) na plataforma Observa Custódia. Em parceria com o Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege), foram colhidas informações em todas as unidades da federação, num total de 174 comarcas.

Na audiência de custódia, estabelecida há quase dez anos no Brasil, o preso é ouvido por um juiz, que avalia a legalidade da prisão, determina sua manutenção ou não e investiga eventuais maus-tratos. Pela regra, devem ocorrer em até 24 horas após a prisão —o que é praticado em 60% das comarcas.

A maioria das unidades de audiência está nas sedes dos tribunais de Justiça dos estados, com 109 dos locais mapeados. Em 53 delas, o procedimento é feito em unidades prisionais, e em 11, numa sede policial civil. A defesa —advogado ou defensor público— pode optar por estar presente na sala de audiência em 58 comarcas, menos da metade (45%).

No modelo virtual, o preso se conecta à audiência da unidade prisional em 78 locais, que representam 60,5% do total. Em seguida estão as sedes de tribunais de Justiça, que chegam a 34.

Em 130 comarcas, o preso acompanha toda a audiência, da sua apresentação à decisão do juiz. Em 39, às vezes, e, em 4, nunca —caso das capitais Belo Horizonte e Aracaju. Ainda, em 94 dos locais nunca há atendimento do preso por uma equipe psicossocial, situação que é ocasional em 22 comarcas e que sempre ocorre em 24 delas. Em 16 unidades, o atendimento é feito após solicitação. Já em seis desses lugares, só ocorre quando o juiz determina uma medida cautelar que não seja a prisão.

Para o presidente do Condege e defensor público-geral de Roraima, Oleno Matos, a principal função da pesquisa é dar parâmetros para, antes mesmo de cobrar o atendimento dentro do que prevê a lei.

“Temos, por exemplo, defensorias e promotorias que pouco buscam saber como está funcionando a questão do exame de corpo de delito. É preciso avançar na busca por mecanismos de prevenção e combate à tortura.”

A detecção de maus-tratos ou tortura, um dos objetivos da audiência, pode ser realizada por meio dos exames periciais, que são feitos em 101 unidades de custódia antes do procedimento, segundo o levantamento. Em 39, isso não ocorre, e em 25 comarcas, às vezes. O problema da falta de exames têm proporções mais elevadas entre as comarcas de Sul e Sudeste, com 35,2% e 29,8% de locais sem falta, respectivamente.

A maioria dos locais (92) realiza os exames nas sedes do Instituto Médico Legal. Já o laudo dos exames é sempre disponibilizado às autoridades em apenas 33 comarcas.

Para a APT, há uma precarização das garantias proteções e do contato do preso com as autoridades judiciais, especialmente em meio remoto. “Distantes fisicamente das autoridades, observamos que detentos têm sido mais frequentemente apresentados usando algemas —e por vezes grilhões nos pés”, diz a organização.

Em 26 comarcas, sempre há o uso de contenção, como algemas. O uso “em regra” é praticado em outros 45 estabelecimentos.

Ainda segundo a organização, a ampla maioria de audiências ocorrendo em menos de 72 horas (99%) é um indicador de compromisso das autoridades com o dispositivo.

Para a APT, há uma tendência de migração do local para a realização da audiência, saindo de sedes judiciais rumo a ambientes policiais, e o uso de uniforme prisional, que ocorre em praticamente metade dos casos, viola a presunção de inocência, diz a organização.

Unidade da federação com a maior população de presos, São Paulo realiza as audiências, em regra, até 24 horas após a detenção. O acesso de familiares às audiências não é permitido. O atendimento médico do custodiado é feito antes ou depois da audiência. Não há atendimento psicossocial, e sempre são usados instrumentos de contenção nos presos.

Quando o juiz percebe indícios de tortura, costuma entrevistar o preso. Já o atendimento da defesa é feito nos corredores, e sempre há agentes de segurança na sala da audiência ou com a possibilidade de ouvir o que é dito pelos presos.



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