Anvisa tem saudade da burocracia pré-digital – 12/11/2024 – Maria Inês Dolci

Parabéns, Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por nos fazer, nostalgicamente, voltar ao passado. Não no sentido de lembranças queridas, mas de retrocesso, mesmo. Estou me referindo à retomada de exigência de receita impressa e carimbada para a compra de remédios com receitas médicas azuis e amarelas no Rio Grande do Sul. Deveria, ao contrário, permitir o uso de receitas digitais para qualquer medicamento, controlado ou não, em todo o Brasil.

A autorização para vender medicamentos controlados com receitas digitais do tipo A, B e B2, nas cores amarelo e azul, era temporária, para os gaúchos, em função das consequências das enchentes de maio deste ano.

Demoramos uma enormidade para regularizar a telemedicina, em um país com dimensões continentais, e agora, quem recorre a esse tipo de consulta, por conforto ou outra conveniência, deverá pedir ao médico que envie a receita pelo Correio.

Um grande avanço, para quem vota em urnas eletrônicas, faz todas as operações bancárias pelo celular, assim como usa apps para pedir transporte, comida, comprar roupa, calçados etc.

Com essa medida, a Anvisa pode, tranquilamente, fazer parte do time da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e da Anatel (Agência Nacional de Telefonia), que certamente não têm como prioridade o consumidor.

E assim, espremidos entre a pobreza e os equívocos (para ser gentil) das agências reguladoras, os direitos dos consumidores crescem como rabo de cavalo, para baixo.

Essa ânsia por regular a regulação, com portarias, normas e que tais, é típica de nossas mazelas nacionais. O gosto por cartórios, reservas de mercado, controle do que não precisa ser controlado, continua a irritar os brasileiros.

Para quem tem alto poder aquisitivo, essa medida da Anvisa não representa grande incômodo. Mas para a maioria da população, que mal ganha para comer, e que despende preciosas horas diárias no trânsito das grandes cidades, ter de buscar uma receita impressa e carimbada, é um grande transtorno. Mas para que simplificar a vida das pessoas com o uso da tecnologia, se é possível burocratizar todos os processos, não é mesmo?

O argumento de que isso é feito para evitar fraudes, seria engraçado, se não prejudicasse as pessoas. Seria como substituir o Pix pelo talão de cheques. Ou trazer de volta as máquinas de escrever, em lugar dos ‘modernosos’ computadores.

Assim, eu me lembrei da música de Raul Seixas, Carimbador Maluco, que tem um trecho bem engraçado (e real, infelizmente). “Tem que ser selado, registrado, carimbado/Avaliado, rotulado se quiser voar!/(Se quiser voar)/Pra Lua: A taxa é alta/Pro Sol: Identidade/Mas já pro seu foguete viajar pelo universo/É preciso meu carimbo dando o sim”. Ele enxergava longe.

Continuamos no ritmo do rabo de cavalo.


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