O chef capixaba que brilha em Nova York à frente do estrelado (e escondido) restaurante Frevo
Em nova coluna, Rosa Moraes explora a jornada de Franco Sampogna em Nova York, com o Frevo se consolidando como um destino culinário que também dialoga com a arte Primeira no ranking das capitais internacionais da arte, de acordo com uma pesquisa da Vistajet, Nova York concentra o maior número de galerias, museus e eventos de arte do mundo, seguida por Londres e Paris. Estima-se que a cidade tenha cerca de 1,5 mil galerias espalhadas por seus cinco distritos, entre mega instituições, espaços sem fins lucrativos e iniciativas individuais dirigidas por artistas. No meio desta cena em altíssima ebulição, hoje chamo a atenção para uma galeria específica situada na vizinhança de Greenwich Village, na 8th Street.
Inaugurado em 2019, o espaço já abrigou exibições de artistas contemporâneos como o fotógrafo Richard Corman e pintores como Khari Turner, Thomas Labarthe e Christopher Fiorentino. Atualmente, a exposição que está em cartaz é a Duality of Perception, do artista multidisciplinar português Pedro Campiche (Akacorleone), que explora a dualidade da percepção que temos das coisas e do mundo ao nosso redor.
A essa altura vocês devem estar se perguntando por que eu, que sou do universo da gastronomia e da hospitalidade, fui me meter a falar de artes plásticas. Pois explico. O nome dessa galeria é Frevo – sim, o nosso folclórico frevo pernambucano – e, como tantos lugares em Nova York, ela esconde um (grande) segredo por trás de suas paredes. E aqui eu estou sendo literal: uma das obras de arte da exposição que estiver em cartaz na galeria é sempre destinada a cobrir uma porta que leva para o restaurante Frevo, do chef brasileiro Franco Sampogna e seu sócio, o português Bernardo Silva.
Chef Franco Sampogna
Divulgação
Dono de uma estrela Michelin e quatro estrelas da Forbes, pontuação máxima na publicação, o Frevo é um “fervo” cosmopolita, assim como a própria cidade. No balcão que acomoda 16 pessoas (há também uma mesa à parte para 8), o menu degustação é um desfile preciso e sem excessos das muitas influências que compõem o trabalho do chef, que se encontrou na cozinha por uma série de casualidades, assim digamos. Neto de italianos e natural de Vitória, no Espírito Santo, Franco se mudou algumas vezes com a família até se estabelecer em Petrópolis, no Rio. Adolescente, ele conta que nem pensava em gastronomia – o negócio dele era sair com os amigos e surfar. Foi quando ele chegou na França a convite de uma tia que vivia lá, aos 17 anos, que essa paixão começou a despertar dentro dele.
Franco Sampogna e seu sócio, o português Bernardo Silva
Divulgação
“Como eu tinha perdido meu pai muito cedo, minha tia quis que eu saísse um pouco do país, que mudasse de ambiente. E foi ela que me mostrou esse lado todo da gastronomia francesa”, ele relembra. “Comecei a descobrir os restaurantes, as sobremesas… Aquelas coisas que você não conhece e quando vem do Brasil fica deslumbrado.” A tia também foi a responsável por orientar o caminho profissional, segundo Franco. A princípio ele queria cursar Direito, mas o francês dele teria que estar mais afiado. Ela então sugeriu que ele buscasse algo mais manual, como a cozinha. Depois de três tentativas, ele conseguiu ingressar em uma rede de escolas públicas de culinária, a Greta. E aí a paixão foi fulminante.
Foi já nessa época que o chef capixaba criou fortes laços de amizade com Bernardo, um jovem que tinha vindo de Portugal para cursar hotelaria, e os dois combinaram de um dia ter um negócio com a cara deles em algum lugar do mundo. Franco então bateu asas. Treinou em alguns dos mais prestigiados restaurantes da França, como o La Chèvre d’Or, o Guy Savoy e a casa de Alain Ducasse no Hotel Plaza Athénée, e em 2015 ficou em segundo lugar no San Pellegrino Young Chef Challenge, vencendo mais de 3,6 mil candidatos – um feito e tanto para um “menino” de 24 anos. No ano seguinte, ele embarcou como chef de um iate privado que viajou pela Europa, pelo Caribe e pela costa dos Estados Unidos. E foi em uma dessas paradas que ele vislumbrou o lugar em que o sonho compartilhado com o amigo poderia ganhar vida: Nova York, a cidade que nunca dorme.
hand roll: cavalinha, ovas de truta, shiso e gengibre
Divulgação
Robalo, molho shoyo, e ossetra caviar
Divulgação
Costela de boi, caldo de pimenta verde e sépia
Divulgação
Em 2019, após meses de busca pelo ponto ideal, o Frevo abriu as portas (e sua porta “secreta”) em Lower Manhattan. Menos de quatro anos depois, o restaurante foi um dos 19 da cidade a ganhar sua primeira estrela Michelin, em reconhecimento ao alto nível da cozinha do brasileiro, ao serviço impecável de vinhos e harmonizações sob a tutela de Quentin Vauléon, eleito Melhor Sommelier Jovem da França em 2017, e ao conjunto da obra hospitaleira, sabiamente capitaneada por Bernardo.
Apesar das origens do chef e de seu sócio, o Frevo é um “melting pot” de culturas, como define Franco. A base técnica é francesa – nos caldos, por exemplo -, mas os produtos são globais e sazonais, fazendo com que os menus variem constante e rapidamente. A equipe também é multicultural: um brasileiro, um português, um italiano, dois coreanos, um chileno e um sul-africano são responsáveis pela criação dos pratos, o que faz com que a experiência apresente um mix de influências que você só prova ali, atrás daquela porta mágica.
Frevo
Divulgação
Na minha visita, o menu trouxe sugestões como o kinmedai – uma espécie de sushi com truta rosa e suas ovas, shiso e nori -, a cenoura de Kyoto com amêndoas e curry vermelho e o peixe kanpachi com jalapeño, caju e folha de curry. Também são bons exemplos da diversidade de saberes o zucchini com pistache, estragão e curry verde e a surpreendente sobremesa que reúne chocolate, wasabi e cogumelo porcini. Já do lado da harmonização premium, que também encanta, figuram rótulos do velho continente, entre França, Alemanha, Itália e Espanha, a começar por um Grand Cru irretocável: o Versy Extra-Brut Primitif do Domaine Pierre Deville, que hoje tem uma produção orgânica de tirar o chapéu.
Franco conta que o seu avô veio da Itália para fugir da guerra e o Brasil virou não só seu novo lar, mas um país de que tinha orgulho. Na última vez que se viram, o avô abraçou o neto na hora da despedida e disse: “Você é capixaba. Quando for para fora, tente dar uma boa imagem do Brasil. Mostre que a gente também sabe fazer bem as coisas”. O chef ainda se emociona ao lembrar da despedida. “Cheguei sem saber bem o que queria fazer, mas a determinação era de fazer bonito, de tentar honrar meus pais e avós. E é o que faço no meu trabalho, no dia a dia. Espero que ele esteja feliz, de onde estiver me vendo”, reflete.
Entrada do restaurante fica escondida atrás de uma obra na galeria de arte Frevo
Divulgação
Nós temos a sorte de testemunhar que o neto de fato cumpriu a missão dada pelo avô. E, assim como ele, ganhou o mundo para escrever uma nova história muito própria, que reflete sua raiz brasileira usando outros ingredientes que fazem parte de quem somos: o esforço e a determinação inquebrantáveis, o talento criativo e a vocação de fazer com que todos se sintam bem-vindos e abraçados. Bonito demais ver uma estrela Michelin “capixaba” brilhar no coração de uma cidade como Nova York, em que galerias e restaurantes se acotovelam para atrair um público exigente e cheio de opções – e que hoje transforma o Frevo em fervo, lotando o balcão para conhecer o trabalho de Franco.
Serviço
Frevo
Instagram @frevonyc
Chef Franco Sampogna
Instagram @francosampogna
Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Vogue Brasil.
Quer participar do canal da Vogue Brasil no WhatsApp?
Basta clicar neste link para participar do canal e receber as novidades em primeira mão. Assim que você entrar, o template comum de conversa do WhatsApp aparece na sua tela. A partir daí, é só esperar as notícias chegarem!
Em nova coluna, Rosa Moraes explora a jornada de Franco Sampogna em Nova York, com o Frevo se consolidando como um destino culinário que também dialoga com a arte Primeira no ranking das capitais internacionais da arte, de acordo com uma pesquisa da Vistajet, Nova York concentra o maior número de galerias, museus e eventos de arte do mundo, seguida por Londres e Paris. Estima-se que a cidade tenha cerca de 1,5 mil galerias espalhadas por seus cinco distritos, entre mega instituições, espaços sem fins lucrativos e iniciativas individuais dirigidas por artistas. No meio desta cena em altíssima ebulição, hoje chamo a atenção para uma galeria específica situada na vizinhança de Greenwich Village, na 8th Street.
Inaugurado em 2019, o espaço já abrigou exibições de artistas contemporâneos como o fotógrafo Richard Corman e pintores como Khari Turner, Thomas Labarthe e Christopher Fiorentino. Atualmente, a exposição que está em cartaz é a Duality of Perception, do artista multidisciplinar português Pedro Campiche (Akacorleone), que explora a dualidade da percepção que temos das coisas e do mundo ao nosso redor.
A essa altura vocês devem estar se perguntando por que eu, que sou do universo da gastronomia e da hospitalidade, fui me meter a falar de artes plásticas. Pois explico. O nome dessa galeria é Frevo – sim, o nosso folclórico frevo pernambucano – e, como tantos lugares em Nova York, ela esconde um (grande) segredo por trás de suas paredes. E aqui eu estou sendo literal: uma das obras de arte da exposição que estiver em cartaz na galeria é sempre destinada a cobrir uma porta que leva para o restaurante Frevo, do chef brasileiro Franco Sampogna e seu sócio, o português Bernardo Silva.
Chef Franco Sampogna
Divulgação
Dono de uma estrela Michelin e quatro estrelas da Forbes, pontuação máxima na publicação, o Frevo é um “fervo” cosmopolita, assim como a própria cidade. No balcão que acomoda 16 pessoas (há também uma mesa à parte para 8), o menu degustação é um desfile preciso e sem excessos das muitas influências que compõem o trabalho do chef, que se encontrou na cozinha por uma série de casualidades, assim digamos. Neto de italianos e natural de Vitória, no Espírito Santo, Franco se mudou algumas vezes com a família até se estabelecer em Petrópolis, no Rio. Adolescente, ele conta que nem pensava em gastronomia – o negócio dele era sair com os amigos e surfar. Foi quando ele chegou na França a convite de uma tia que vivia lá, aos 17 anos, que essa paixão começou a despertar dentro dele.
Franco Sampogna e seu sócio, o português Bernardo Silva
Divulgação
“Como eu tinha perdido meu pai muito cedo, minha tia quis que eu saísse um pouco do país, que mudasse de ambiente. E foi ela que me mostrou esse lado todo da gastronomia francesa”, ele relembra. “Comecei a descobrir os restaurantes, as sobremesas… Aquelas coisas que você não conhece e quando vem do Brasil fica deslumbrado.” A tia também foi a responsável por orientar o caminho profissional, segundo Franco. A princípio ele queria cursar Direito, mas o francês dele teria que estar mais afiado. Ela então sugeriu que ele buscasse algo mais manual, como a cozinha. Depois de três tentativas, ele conseguiu ingressar em uma rede de escolas públicas de culinária, a Greta. E aí a paixão foi fulminante.
Foi já nessa época que o chef capixaba criou fortes laços de amizade com Bernardo, um jovem que tinha vindo de Portugal para cursar hotelaria, e os dois combinaram de um dia ter um negócio com a cara deles em algum lugar do mundo. Franco então bateu asas. Treinou em alguns dos mais prestigiados restaurantes da França, como o La Chèvre d’Or, o Guy Savoy e a casa de Alain Ducasse no Hotel Plaza Athénée, e em 2015 ficou em segundo lugar no San Pellegrino Young Chef Challenge, vencendo mais de 3,6 mil candidatos – um feito e tanto para um “menino” de 24 anos. No ano seguinte, ele embarcou como chef de um iate privado que viajou pela Europa, pelo Caribe e pela costa dos Estados Unidos. E foi em uma dessas paradas que ele vislumbrou o lugar em que o sonho compartilhado com o amigo poderia ganhar vida: Nova York, a cidade que nunca dorme.
hand roll: cavalinha, ovas de truta, shiso e gengibre
Divulgação
Robalo, molho shoyo, e ossetra caviar
Divulgação
Costela de boi, caldo de pimenta verde e sépia
Divulgação
Em 2019, após meses de busca pelo ponto ideal, o Frevo abriu as portas (e sua porta “secreta”) em Lower Manhattan. Menos de quatro anos depois, o restaurante foi um dos 19 da cidade a ganhar sua primeira estrela Michelin, em reconhecimento ao alto nível da cozinha do brasileiro, ao serviço impecável de vinhos e harmonizações sob a tutela de Quentin Vauléon, eleito Melhor Sommelier Jovem da França em 2017, e ao conjunto da obra hospitaleira, sabiamente capitaneada por Bernardo.
Apesar das origens do chef e de seu sócio, o Frevo é um “melting pot” de culturas, como define Franco. A base técnica é francesa – nos caldos, por exemplo -, mas os produtos são globais e sazonais, fazendo com que os menus variem constante e rapidamente. A equipe também é multicultural: um brasileiro, um português, um italiano, dois coreanos, um chileno e um sul-africano são responsáveis pela criação dos pratos, o que faz com que a experiência apresente um mix de influências que você só prova ali, atrás daquela porta mágica.
Frevo
Divulgação
Na minha visita, o menu trouxe sugestões como o kinmedai – uma espécie de sushi com truta rosa e suas ovas, shiso e nori -, a cenoura de Kyoto com amêndoas e curry vermelho e o peixe kanpachi com jalapeño, caju e folha de curry. Também são bons exemplos da diversidade de saberes o zucchini com pistache, estragão e curry verde e a surpreendente sobremesa que reúne chocolate, wasabi e cogumelo porcini. Já do lado da harmonização premium, que também encanta, figuram rótulos do velho continente, entre França, Alemanha, Itália e Espanha, a começar por um Grand Cru irretocável: o Versy Extra-Brut Primitif do Domaine Pierre Deville, que hoje tem uma produção orgânica de tirar o chapéu.
Franco conta que o seu avô veio da Itália para fugir da guerra e o Brasil virou não só seu novo lar, mas um país de que tinha orgulho. Na última vez que se viram, o avô abraçou o neto na hora da despedida e disse: “Você é capixaba. Quando for para fora, tente dar uma boa imagem do Brasil. Mostre que a gente também sabe fazer bem as coisas”. O chef ainda se emociona ao lembrar da despedida. “Cheguei sem saber bem o que queria fazer, mas a determinação era de fazer bonito, de tentar honrar meus pais e avós. E é o que faço no meu trabalho, no dia a dia. Espero que ele esteja feliz, de onde estiver me vendo”, reflete.
Entrada do restaurante fica escondida atrás de uma obra na galeria de arte Frevo
Divulgação
Nós temos a sorte de testemunhar que o neto de fato cumpriu a missão dada pelo avô. E, assim como ele, ganhou o mundo para escrever uma nova história muito própria, que reflete sua raiz brasileira usando outros ingredientes que fazem parte de quem somos: o esforço e a determinação inquebrantáveis, o talento criativo e a vocação de fazer com que todos se sintam bem-vindos e abraçados. Bonito demais ver uma estrela Michelin “capixaba” brilhar no coração de uma cidade como Nova York, em que galerias e restaurantes se acotovelam para atrair um público exigente e cheio de opções – e que hoje transforma o Frevo em fervo, lotando o balcão para conhecer o trabalho de Franco.
Serviço
Frevo
Instagram @frevonyc
Chef Franco Sampogna
Instagram @francosampogna
Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Vogue Brasil.
Quer participar do canal da Vogue Brasil no WhatsApp?
Basta clicar neste link para participar do canal e receber as novidades em primeira mão. Assim que você entrar, o template comum de conversa do WhatsApp aparece na sua tela. A partir daí, é só esperar as notícias chegarem!
Post Comment