“A terra é nossa”: palestinos reagem à proposta de Trump governar Gaza

Uma mulher idosa em cadeira de rodas avança com a ajuda de um homem enquanto dezenas de milhares de palestinos, deslocados pelas forças de Israel, retornam às suas casas pela rua Al-Rashid, na faixa costeira, após o acordo de cessar-fogo na cidade de Gaza -Metrópoles


A população palestina da Faixa de Gaza reagiu com indignação às declarações de Donald Trump de que pretende assumir o controle do território completamente devastado pelos ataques israelenses.

A imprensa internacional e analistas também repercutiram as propostas do presidente americano lançadas após um encontro com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, na Casa Branca, na terça-feira (4/2).

Trump anunciou a intenção de assumir o controle da Faixa de Gaza para transformá-la em área turística e sugeriu que os palestinos da região devem procurar abrigo em outros países.

Na cidade de Gaza, o jornalista Rami Al Meghari, da RFI, falou nesta manhã com moradores da principal cidade do enclave.

“O plano de Trump está fadado ao fracasso”, afirma Hadj Mohaned, um palestino idoso. “A fome não nos fez deixar Gaza, não será Trump que nos fará partir. Esta é nossa terra”, acrescenta.

“Minha mensagem para Trump e para todos os que cobiçam Gaza: esta é nossa terra. Vivemos aqui e morreremos aqui. Apesar de todas as bombas que caíram sobre nós e de todas as destruições, escolhemos ficar aqui”, diz o jovem Mohamed.

O plano do presidente americano prevê o deslocamento da população para a Jordânia ou o Egito, países vizinhos.

Aazza é palestino-egípcia e vive em Gaza desde a infância. “Donald Trump pode guardar suas brilhantes ideias para ele”, ironiza a jovem. “Meu pai é egípcio e minha mãe é palestina. Mas sou muito ligada à Palestina, nunca partirei. Amo Gaza. E, ao contrário de outros palestinos de Gaza, eu poderia me instalar no Egito por escolha. Mas me recuso a sofrer um deslocamento forçado.”

“Banalizar o inaceitável e provocar desequilíbrio”

“Com o plano em Gaza, um Trump sem rédeas lança uma ideia improvável”, diz a manchete de uma análise do New York Times. “As proposições de Trump estavam tão fora da caixa que não estava claro se ele sabia que havia uma caixa”, escreve o jornalista Peter Baker.

“São propostas ainda mais ousadas para redesenhar o mapa-múndi na tradição do imperialismo do século 19. Primeiro foi comprar a Groenlândia, depois, anexar o Canadá, retomar o Canal do Panamá e rebatizar o Golfo do México. Propostas dignas de um programa de entrevistas bombásticas”, analisa o diário americano.

O jornal francês Le Monde lembra que tirar dois milhões de habitantes de um território destruído, controlado por um movimento islâmico armado, ao longo de 40km, “necessitaria um grande contingente militar americano – hipótese que Trump não descarta – e que pode levar à morte de dezenas e até centenas de soldado”.

Dois cenários se desenham, segundo o correspondente do Le Monde em Washington, Piotr Smolar: “ou o presidente americano fala sério, ou muda os termos do debate, como faz habitualmente, para banalizar o inaceitável e provocar desequilíbrio”.

Outro jornal francês, Le Figaro, compara as atitudes de Trump a de um lutador de luta livre, “esporte onde o resultado é combinado, com forças desiguais entre adversários, onde a violência e a amoralidade são leis”.

“Desde que entrou na política, o republicano iconoclasta se comporta como um lutador na cena mundial, abusando de frases ameaçadoras e desenfreadas”, analisa Victor Mérat, nas páginas do Le Figaro.

Uma tática de Trump é dividir para reinar melhor, diz Jérôme Viala-Gaudefroy, doutor em civilização, ao jornal. “Ele faz isso usando elogios ou insultos. Ele coloca os países uns contra os outros. É uma reminiscência da sua forma de trabalhar no seu gabinete durante a sua primeira presidência, do seu gosto pelos esportes de combate, mas também do que encenou no seu reality show ‘O Aprendiz’, onde popularizou a frase ‘Você está despedido!’”.

Afronta ao direito internacional

Em entrevista à Rádio e Televisão Suíça, o especialista Hasni Adibi avalia que o presidente americano “ultrapassa uma linha vermelha que seus predecessores não ousaram atravessar”, que é “a deportação forçada de uma população”, algo que “é considerado um crime de guerra aos olhos do direito internacional”.

Ao propor um plano desse tipo, Donald Trump “despreza o direito internacional, a legalidade internacional”, especialmente considerando que ele é o presidente de um país que é “membro do Conselho de Segurança” e “patrocinador de um acordo de paz”, lembra Hasna Abidi. Ele acrescenta ainda que Benjamin Netanyahu, em presença de quem as propostas foram feitas, é ele mesmo “objeto de um mandado internacional”.

Extrema direita israelense aplaude

Sem surpresa, a extrema direita israelense foi a primeira a aplaudir a proposta de Donald Trump, aponta o jornal francês Libération. O supremacista judeu Itamar Ben-Gvir elogiou a ideia de remover dois milhões de palestinos da Faixa de Gaza. “Acho que isso é o começo de uma amizade muito bonita”, afirmou Ben-Givir, parafraseando a última frase do filme “Casablanca”.

“Vamos tornar o mundo grande de novo”, acrescentou Bezalel Smotrich, ainda ministro das Finanças, mas ameaçando deixar o governo caso a guerra contra o Hamas não seja retomada.

Por sua vez, o ultranacionalista Avigdor Lieberman, embora contrário a Benjamin Netanyahu, chamou a deportação dos palestinos de “uma solução justa”.

Críticas da comunidade internacional

Donald Trump declarou que o Egito e a Jordânia poderiam receber os palestinos de Gaza. “Tenho a sensação de que o rei da Jordânia e o general do Egito vão abrir seus corações e nós vamos dar a terra de que precisamos para fazer isso, para que as pessoas possam viver em paz”, disse o presidente americano na noite de terça-feira.

O mundo árabe reagiu indignado. Abdel Latif Al-Qanou, porta-voz do movimento islâmico palestino Hamas disse em comunicado que “a posição racista americana se alinha com a da extrema direita israelense no deslocamento do nosso povo e na eliminação da nossa causa”.

No Cairo, o ministro egípcio das Relações Exteriores, Badr Abdelatty, insistiu na importância de fortalecer política e economicamente a Autoridade Palestina em Gaza. Durante uma reunião com o primeiro-ministro palestino, Mohammed Mustafa, ele afirmou que o Egito estava ansioso para ver a Autoridade Palestina “assumir suas responsabilidades na Faixa de Gaza como parte dos territórios palestinos ocupados”.

A Arábia Saudita, em declaração pelo X, declarou que “O ministério das Relações Exteriores afirma que a posição do Reino da Arábia Saudita sobre a criação de um Estado palestino é uma posição firme e inabalável.” A mensagem acrescenta que “o reino da Arábia Saudita reitera sua declaração anterior de rejeição absoluta de qualquer ataque aos direitos legítimos do povo palestino, seja através de políticas de colonização, anexação de terras palestinas ou tentativas de deslocar o povo palestino das suas terras”.

“Genocídio”, reitera Lula

“Não faz sentido. Onde os palestinos viveriam? Isso é algo incompreensível para qualquer ser humano”, disse o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendendo a solução de dois Estados e repetindo suas denúncias anteriores da ação militar de Israel em Gaza como “genocídio”.

“São os palestinos que precisam cuidar de Gaza”, acrescentou Lula.

Paris reagiu rapidamente às propostas de Donald Trump. O ministério das Relações Exteriores francês esclareceu que “o futuro de Gaza deve se inscrever não na perspectiva de um controle por um Estado terceiro, mas no quadro de um futuro Estado palestino, sob a égide da Autoridade Palestina”. O Quai d’Orsay, sede da diplomacia francesa, também reafirmou a oposição da França a “qualquer deslocamento forçado da população palestina de Gaza”.

A porta-voz do governo francês, Sophie Primas, insistiu: “A França rejeita firmemente o deslocamento forçado das populações. Mantemos nossa posição constante: não deve haver deslocamento, mas uma busca por um cessar-fogo temporário, visando um processo de paz, e uma solução de dois Estados, israelense e palestino.”

Por sua vez, o chefe da diplomacia britânica, David Lammy, destacou que os palestinos devem poder “viver e prosperar” em Gaza e na Cisjordânia, uma posição que vai contra as propostas americanas.

Já a China insistiu que os palestinos devem governar a si mesmos. “Com oposição à deslocação forçada da população de Gaza, esperamos que todas as partes envolvidas aproveitem a oportunidade do cessar-fogo em Gaza e da governança pós-guerra para recolocar a questão palestina no caminho certo, o de uma resolução política baseada na ‘solução de dois Estados’, a fim de alcançar uma paz duradoura no Oriente Médio”, afirmou à RFI Lin Jian, porta-voz do ministério das Relações Exteriores chinês.

Leia mais reportagens como essa na RFI, parceiro do Metrópoles. 

A população palestina da Faixa de Gaza reagiu com indignação às declarações de Donald Trump de que pretende assumir o controle do território completamente devastado pelos ataques israelenses.

A imprensa internacional e analistas também repercutiram as propostas do presidente americano lançadas após um encontro com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, na Casa Branca, na terça-feira (4/2).

Trump anunciou a intenção de assumir o controle da Faixa de Gaza para transformá-la em área turística e sugeriu que os palestinos da região devem procurar abrigo em outros países.

Na cidade de Gaza, o jornalista Rami Al Meghari, da RFI, falou nesta manhã com moradores da principal cidade do enclave.

“O plano de Trump está fadado ao fracasso”, afirma Hadj Mohaned, um palestino idoso. “A fome não nos fez deixar Gaza, não será Trump que nos fará partir. Esta é nossa terra”, acrescenta.

“Minha mensagem para Trump e para todos os que cobiçam Gaza: esta é nossa terra. Vivemos aqui e morreremos aqui. Apesar de todas as bombas que caíram sobre nós e de todas as destruições, escolhemos ficar aqui”, diz o jovem Mohamed.

O plano do presidente americano prevê o deslocamento da população para a Jordânia ou o Egito, países vizinhos.

Aazza é palestino-egípcia e vive em Gaza desde a infância. “Donald Trump pode guardar suas brilhantes ideias para ele”, ironiza a jovem. “Meu pai é egípcio e minha mãe é palestina. Mas sou muito ligada à Palestina, nunca partirei. Amo Gaza. E, ao contrário de outros palestinos de Gaza, eu poderia me instalar no Egito por escolha. Mas me recuso a sofrer um deslocamento forçado.”

“Banalizar o inaceitável e provocar desequilíbrio”

“Com o plano em Gaza, um Trump sem rédeas lança uma ideia improvável”, diz a manchete de uma análise do New York Times. “As proposições de Trump estavam tão fora da caixa que não estava claro se ele sabia que havia uma caixa”, escreve o jornalista Peter Baker.

“São propostas ainda mais ousadas para redesenhar o mapa-múndi na tradição do imperialismo do século 19. Primeiro foi comprar a Groenlândia, depois, anexar o Canadá, retomar o Canal do Panamá e rebatizar o Golfo do México. Propostas dignas de um programa de entrevistas bombásticas”, analisa o diário americano.

O jornal francês Le Monde lembra que tirar dois milhões de habitantes de um território destruído, controlado por um movimento islâmico armado, ao longo de 40km, “necessitaria um grande contingente militar americano – hipótese que Trump não descarta – e que pode levar à morte de dezenas e até centenas de soldado”.

Dois cenários se desenham, segundo o correspondente do Le Monde em Washington, Piotr Smolar: “ou o presidente americano fala sério, ou muda os termos do debate, como faz habitualmente, para banalizar o inaceitável e provocar desequilíbrio”.

Outro jornal francês, Le Figaro, compara as atitudes de Trump a de um lutador de luta livre, “esporte onde o resultado é combinado, com forças desiguais entre adversários, onde a violência e a amoralidade são leis”.

“Desde que entrou na política, o republicano iconoclasta se comporta como um lutador na cena mundial, abusando de frases ameaçadoras e desenfreadas”, analisa Victor Mérat, nas páginas do Le Figaro.

Uma tática de Trump é dividir para reinar melhor, diz Jérôme Viala-Gaudefroy, doutor em civilização, ao jornal. “Ele faz isso usando elogios ou insultos. Ele coloca os países uns contra os outros. É uma reminiscência da sua forma de trabalhar no seu gabinete durante a sua primeira presidência, do seu gosto pelos esportes de combate, mas também do que encenou no seu reality show ‘O Aprendiz’, onde popularizou a frase ‘Você está despedido!’”.

Afronta ao direito internacional

Em entrevista à Rádio e Televisão Suíça, o especialista Hasni Adibi avalia que o presidente americano “ultrapassa uma linha vermelha que seus predecessores não ousaram atravessar”, que é “a deportação forçada de uma população”, algo que “é considerado um crime de guerra aos olhos do direito internacional”.

Ao propor um plano desse tipo, Donald Trump “despreza o direito internacional, a legalidade internacional”, especialmente considerando que ele é o presidente de um país que é “membro do Conselho de Segurança” e “patrocinador de um acordo de paz”, lembra Hasna Abidi. Ele acrescenta ainda que Benjamin Netanyahu, em presença de quem as propostas foram feitas, é ele mesmo “objeto de um mandado internacional”.

Extrema direita israelense aplaude

Sem surpresa, a extrema direita israelense foi a primeira a aplaudir a proposta de Donald Trump, aponta o jornal francês Libération. O supremacista judeu Itamar Ben-Gvir elogiou a ideia de remover dois milhões de palestinos da Faixa de Gaza. “Acho que isso é o começo de uma amizade muito bonita”, afirmou Ben-Givir, parafraseando a última frase do filme “Casablanca”.

“Vamos tornar o mundo grande de novo”, acrescentou Bezalel Smotrich, ainda ministro das Finanças, mas ameaçando deixar o governo caso a guerra contra o Hamas não seja retomada.

Por sua vez, o ultranacionalista Avigdor Lieberman, embora contrário a Benjamin Netanyahu, chamou a deportação dos palestinos de “uma solução justa”.

Críticas da comunidade internacional

Donald Trump declarou que o Egito e a Jordânia poderiam receber os palestinos de Gaza. “Tenho a sensação de que o rei da Jordânia e o general do Egito vão abrir seus corações e nós vamos dar a terra de que precisamos para fazer isso, para que as pessoas possam viver em paz”, disse o presidente americano na noite de terça-feira.

O mundo árabe reagiu indignado. Abdel Latif Al-Qanou, porta-voz do movimento islâmico palestino Hamas disse em comunicado que “a posição racista americana se alinha com a da extrema direita israelense no deslocamento do nosso povo e na eliminação da nossa causa”.

No Cairo, o ministro egípcio das Relações Exteriores, Badr Abdelatty, insistiu na importância de fortalecer política e economicamente a Autoridade Palestina em Gaza. Durante uma reunião com o primeiro-ministro palestino, Mohammed Mustafa, ele afirmou que o Egito estava ansioso para ver a Autoridade Palestina “assumir suas responsabilidades na Faixa de Gaza como parte dos territórios palestinos ocupados”.

A Arábia Saudita, em declaração pelo X, declarou que “O ministério das Relações Exteriores afirma que a posição do Reino da Arábia Saudita sobre a criação de um Estado palestino é uma posição firme e inabalável.” A mensagem acrescenta que “o reino da Arábia Saudita reitera sua declaração anterior de rejeição absoluta de qualquer ataque aos direitos legítimos do povo palestino, seja através de políticas de colonização, anexação de terras palestinas ou tentativas de deslocar o povo palestino das suas terras”.

“Genocídio”, reitera Lula

“Não faz sentido. Onde os palestinos viveriam? Isso é algo incompreensível para qualquer ser humano”, disse o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendendo a solução de dois Estados e repetindo suas denúncias anteriores da ação militar de Israel em Gaza como “genocídio”.

“São os palestinos que precisam cuidar de Gaza”, acrescentou Lula.

Paris reagiu rapidamente às propostas de Donald Trump. O ministério das Relações Exteriores francês esclareceu que “o futuro de Gaza deve se inscrever não na perspectiva de um controle por um Estado terceiro, mas no quadro de um futuro Estado palestino, sob a égide da Autoridade Palestina”. O Quai d’Orsay, sede da diplomacia francesa, também reafirmou a oposição da França a “qualquer deslocamento forçado da população palestina de Gaza”.

A porta-voz do governo francês, Sophie Primas, insistiu: “A França rejeita firmemente o deslocamento forçado das populações. Mantemos nossa posição constante: não deve haver deslocamento, mas uma busca por um cessar-fogo temporário, visando um processo de paz, e uma solução de dois Estados, israelense e palestino.”

Por sua vez, o chefe da diplomacia britânica, David Lammy, destacou que os palestinos devem poder “viver e prosperar” em Gaza e na Cisjordânia, uma posição que vai contra as propostas americanas.

Já a China insistiu que os palestinos devem governar a si mesmos. “Com oposição à deslocação forçada da população de Gaza, esperamos que todas as partes envolvidas aproveitem a oportunidade do cessar-fogo em Gaza e da governança pós-guerra para recolocar a questão palestina no caminho certo, o de uma resolução política baseada na ‘solução de dois Estados’, a fim de alcançar uma paz duradoura no Oriente Médio”, afirmou à RFI Lin Jian, porta-voz do ministério das Relações Exteriores chinês.

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