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14 Mar 2025, Fri

Reportagem expõe supostas falas explícitas de Silvio Almeida para Anielle Franco e sequência de episódios


Uma reportagem da revista Piauí, publicada nesta sexta-feira (7), esmiuçou as denúncias de assédio sexual contra Silvio Almeida. O ex-ministro dos Direitos Humanos foi acusado de importunação sexual pela ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e por antigas alunas, através da ONG Me Too Brasil.

Sob o título “A anatomia do escândalo que derrubou Silvio Almeida”, a jornalista Ana Clara Costa expôs a cronologia dos episódios, que levaram à demissão do ex-ministro e à abertura de um inquérito na PF. De acordo com Ana Clara, os eventos descritos na reportagem decorrem de 39 entrevistas realizadas durante quatro meses, entre Brasília e São Paulo. Foram 28 homens e 11 mulheres ouvidos.

O primeiro suposto comentário de Almeida ocorreu em 30 de dezembro de 2022. Para dar boas-vindas ao então advogado, que assumiria o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, os integrantes do governo de transição se reuniram em um apartamento, em Brasília, para comer uma pizza. Como Almeida era novato na gestação pública, o objetivo do encontro era integrá-lo a pessoas que conheciam o funcionamento da pasta.

Acompanhado da esposa, Ednéia Carvalho, e duas assessoras, Almeida revelou aos presentes, incluindo Anielle, que sua mulher estava grávida do primeiro filho do casal. Minutos depois, ele e a recém-nomeada ministra da Igualdade Racial se cruzaram em um dos ambientes da sala, sozinhos. Durante a conversa, Almeida se aproximou de Anielle e, em seu ouvido, teria sussurrado: “Nossa, como você está linda e cheirosa hoje“. Desconcertada, a ministra teria apenas dito “obrigada” e se afastado. Ela não classificou a fala como assédio, mas decidiu evitar proximidade com o novo ministro, conforme a revista.

Quatro meses depois, em abril de 2023, teria acontecido o primeiro suposto assédio verbal. Anielle e Almeida participaram da primeira viagem internacional do presidente Lula após sua posse. Durante uma reunião em Lisboa, o então ministro teria elevado o tom e feito declarações explícitas para Anielle. “Quando olho para os seus ombros, sinto tesão”, “Me dá vontade de morder e lamber”, “Desde a primeira vez que te vi, te achei muito gostosa“, teriam sido algumas das frases proferidas por Almeida. Ela, por sua vez, teria ficado paralisada e não reagido, tentando assimilar a situação. Nas semanas seguintes, as frases teriam dado espaço para comentários do tipo “vontade de te foder com força” e “vontade de te foder com raiva“.

Importunações sexuais vieram à tona em setembro de 2024. (Foto: Reprodução/UOL)

Em maio de 2023, de acordo com a piauí, uma agressão física teria acontecido durante uma Reunião Ministerial, em Brasília. O encontro discutia políticas antirracistas em aeroportos e era integrado por Almeida, Anielle, o diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, e outros oito servidores. O ministro chegou atrasado e irritou Anielle. Durante a conversa, ele teria deslizado a mão entre as pernas dela e supostamente tentado tocá-la de forma invasiva. Ela, por sua vez, teria o repelido imediatamente e ficado visivelmente abalada. Após o encontro, a ministra teria decidido relatar todo o ocorrido a amigos próximos e pessoas do governo.

Após meses de supostos assédios, Anielle convidou Almeida, em agosto de 2023, para um jantar no restaurante Oscar, no Hotel Brasília Palace, para uma conversa definitiva. No encontro, a ministra expressou seu incômodo e tentou pacificar a relação, sugerindo que trabalhassem juntos. Almeida se desculpou e concordou em melhorar o convívio. Contudo, ao deixar o local, no estacionamento, ele teria se aproximado do rosto dela e sussurrado: “Eu te foderia gostoso“. Anielle teria ficado em choque e certa de que os episódios não cessariam.

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Denúncias públicas

Os rumores de importunação sexual começaram a circular na imprensa em setembro de 2024. A ministra da Igualdade Racial teria sofrido meses de desconforto e evitado Almeida ao máximo durante todo esse período. Neste mesmo mês, a ONG Me Too Brasil recebeu denúncias de várias mulheres sobre assédio sexual envolvendo o ex-ministro. O primeiro a publicar sobre os casos foi o portal Metrópoles. Almeida, por sua vez, negou as acusações, mas não conseguiu diminuir a repercussão.

Em 6 de setembro daquele ano, Lula convocou Almeida para uma reunião no Palácio do Planalto, onde o acusado negou tudo novamente e afirmou ser alvo de uma conspiração. Todavia, o presidente o demitiu do cargo de Ministro dos Direitos Humanos. No mesmo dia, Anielle se reuniu com Lula e desabou em lágrimas, segundo a piauí. No mês seguinte, a Polícia Federal abriu uma investigação oficial sobre Almeida.

Ex-alunas de Silvio Almeida denunciaram assédio. (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Ex-alunas da Universidade São Judas Tadeu relataram episódios de assédio de Almeida quando ele era professor. A professora Isabel Rodrigues acusou o ex-ministro de tocá-la nas partes íntimas durante um almoço, em 2019. Outras quatro mulheres ainda prestaram depoimento formal. Almeida se afastou da mídia e só retornou às redes sociais em fevereiro deste ano. Ele quebrou o silêncio com um texto no Instagram, intitulado “Tentaram me matar”.

O ex-ministro se colocou como alvo de um complô político e racista, sem reconhecer as acusações. Em entrevista ao UOL, ele também sugeriu que Anielle “se perdeu no personagem” e que a denúncia teve motivações políticas. Além disso, Almeida divulgou mensagens de WhatsApp trocadas com Anielle para provar que havia cordialidade entre eles. No entanto, o STF considerou seu comportamento incompatível e o inquérito foi prorrogado até abril de 2025.

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O caso de Silvio Almeida é considerado um dos escândalos políticos mais marcantes do governo atual de Lula. O presidente só foi informado sobre o ocorrido meses antes da denúncia vir a público e a decisão de demitir só ocorreu sob forte pressão. Ainda de acordo com a revista, o escândalo revelou omissões na cúpula do governo e expôs o dilema de proteger uma ministra negra enquanto acusava um ministro negro influente.

Parte do movimento negro hesitou em apoiar Anielle, temendo que a denúncia prejudicasse uma das poucas lideranças negras de destaque na política. Djamila Ribeiro e Sueli Carneiro foram algumas das que se posicionaram a favor dela. O inquérito segue em andamento, e Almeida poderá ser indiciado nos próximos meses.


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Uma reportagem da revista Piauí, publicada nesta sexta-feira (7), esmiuçou as denúncias de assédio sexual contra Silvio Almeida. O ex-ministro dos Direitos Humanos foi acusado de importunação sexual pela ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e por antigas alunas, através da ONG Me Too Brasil.

Sob o título “A anatomia do escândalo que derrubou Silvio Almeida”, a jornalista Ana Clara Costa expôs a cronologia dos episódios, que levaram à demissão do ex-ministro e à abertura de um inquérito na PF. De acordo com Ana Clara, os eventos descritos na reportagem decorrem de 39 entrevistas realizadas durante quatro meses, entre Brasília e São Paulo. Foram 28 homens e 11 mulheres ouvidos.

O primeiro suposto comentário de Almeida ocorreu em 30 de dezembro de 2022. Para dar boas-vindas ao então advogado, que assumiria o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, os integrantes do governo de transição se reuniram em um apartamento, em Brasília, para comer uma pizza. Como Almeida era novato na gestação pública, o objetivo do encontro era integrá-lo a pessoas que conheciam o funcionamento da pasta.

Acompanhado da esposa, Ednéia Carvalho, e duas assessoras, Almeida revelou aos presentes, incluindo Anielle, que sua mulher estava grávida do primeiro filho do casal. Minutos depois, ele e a recém-nomeada ministra da Igualdade Racial se cruzaram em um dos ambientes da sala, sozinhos. Durante a conversa, Almeida se aproximou de Anielle e, em seu ouvido, teria sussurrado: “Nossa, como você está linda e cheirosa hoje“. Desconcertada, a ministra teria apenas dito “obrigada” e se afastado. Ela não classificou a fala como assédio, mas decidiu evitar proximidade com o novo ministro, conforme a revista.

Quatro meses depois, em abril de 2023, teria acontecido o primeiro suposto assédio verbal. Anielle e Almeida participaram da primeira viagem internacional do presidente Lula após sua posse. Durante uma reunião em Lisboa, o então ministro teria elevado o tom e feito declarações explícitas para Anielle. “Quando olho para os seus ombros, sinto tesão”, “Me dá vontade de morder e lamber”, “Desde a primeira vez que te vi, te achei muito gostosa“, teriam sido algumas das frases proferidas por Almeida. Ela, por sua vez, teria ficado paralisada e não reagido, tentando assimilar a situação. Nas semanas seguintes, as frases teriam dado espaço para comentários do tipo “vontade de te foder com força” e “vontade de te foder com raiva“.

Importunações sexuais vieram à tona em setembro de 2024. (Foto: Reprodução/UOL)

Em maio de 2023, de acordo com a piauí, uma agressão física teria acontecido durante uma Reunião Ministerial, em Brasília. O encontro discutia políticas antirracistas em aeroportos e era integrado por Almeida, Anielle, o diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, e outros oito servidores. O ministro chegou atrasado e irritou Anielle. Durante a conversa, ele teria deslizado a mão entre as pernas dela e supostamente tentado tocá-la de forma invasiva. Ela, por sua vez, teria o repelido imediatamente e ficado visivelmente abalada. Após o encontro, a ministra teria decidido relatar todo o ocorrido a amigos próximos e pessoas do governo.

Após meses de supostos assédios, Anielle convidou Almeida, em agosto de 2023, para um jantar no restaurante Oscar, no Hotel Brasília Palace, para uma conversa definitiva. No encontro, a ministra expressou seu incômodo e tentou pacificar a relação, sugerindo que trabalhassem juntos. Almeida se desculpou e concordou em melhorar o convívio. Contudo, ao deixar o local, no estacionamento, ele teria se aproximado do rosto dela e sussurrado: “Eu te foderia gostoso“. Anielle teria ficado em choque e certa de que os episódios não cessariam.

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Em 6 de setembro daquele ano, Lula convocou Almeida para uma reunião no Palácio do Planalto, onde o acusado negou tudo novamente e afirmou ser alvo de uma conspiração. Todavia, o presidente o demitiu do cargo de Ministro dos Direitos Humanos. No mesmo dia, Anielle se reuniu com Lula e desabou em lágrimas, segundo a piauí. No mês seguinte, a Polícia Federal abriu uma investigação oficial sobre Almeida.

Ex-alunas de Silvio Almeida denunciaram assédio. (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Ex-alunas da Universidade São Judas Tadeu relataram episódios de assédio de Almeida quando ele era professor. A professora Isabel Rodrigues acusou o ex-ministro de tocá-la nas partes íntimas durante um almoço, em 2019. Outras quatro mulheres ainda prestaram depoimento formal. Almeida se afastou da mídia e só retornou às redes sociais em fevereiro deste ano. Ele quebrou o silêncio com um texto no Instagram, intitulado “Tentaram me matar”.

O ex-ministro se colocou como alvo de um complô político e racista, sem reconhecer as acusações. Em entrevista ao UOL, ele também sugeriu que Anielle “se perdeu no personagem” e que a denúncia teve motivações políticas. Além disso, Almeida divulgou mensagens de WhatsApp trocadas com Anielle para provar que havia cordialidade entre eles. No entanto, o STF considerou seu comportamento incompatível e o inquérito foi prorrogado até abril de 2025.

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Parte do movimento negro hesitou em apoiar Anielle, temendo que a denúncia prejudicasse uma das poucas lideranças negras de destaque na política. Djamila Ribeiro e Sueli Carneiro foram algumas das que se posicionaram a favor dela. O inquérito segue em andamento, e Almeida poderá ser indiciado nos próximos meses.


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