Ekaterina e Olga enfrentaram a repressão na Rússia por viverem um amor lésbico, especialmente após o endurecimento das leis contra a comunidade LGBTQIAPN+. Há dois meses no Brasil, as duas celebram a liberdade de demonstrar seu amor publicamente, algo impossível em seu país natal: ‘A gente basicamente vivia com um medo constante’ As russas Ekaterina Nenakhova, 30 e Olga Osipova, 25, dizem que nunca conseguiram viver o relacionamento com liberdade em seu país natal. Foi somente quando desembarcaram no Brasil, há dois meses, que as escritoras começaram a perder o medo de poder demonstrar o seu amor em público. A Marie Claire, as duas contam como se tornar um viral no TikTok brasileiro as fizeram tomar coragem para imigrarem de vez.
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O casal se conheceu em 2021 e logo iniciou o namoro. “É uma clássica história ‘sapatônica’”, brinca Ekaterina, que participou de um concurso de histórias LGBTQIAPN+ do qual Olga era jurada. “Eu sabia quem era porque ela [Ekaterina] era muito popular no meio queer, tinha até um canal no YouTube. Li o texto em anônimo para não influenciar o processo. Mas, mesmo assim, eu percebi que era dela. Foi o único que falava sobre corpo, sobre segurança, sobre ser quem você é”, revela a parceira.
Olguinha, como é chamada pela namorada, tomou a iniciativa ao mandar mensagem para a escritora logo após o concurso. O flerte deu certo e, cerca de dois meses depois, já estavam morando juntas. No entanto, o simples fato de estarem apaixonadas se tornou um desafio constante pelas leis do país.
Desde 2013, existe uma lei na Rússia que proíbe a “propaganda” que poderia promover “relações e/ou preferências sexuais não tradicionais”, sob a justificativa de proteger “valores tradicionais”. “O que acontecia quando a gente se conheceu, é que todas as atividades LGBTQIAPN+, por exemplo, tinham restrição para maiores de idade. Existiam até baladas gays em Moscou, mais restritas, porém existiam”, diz Ekaterina.
Com a guerra na Ucrânia, a repressão se intensificou: o presidente Vladimir Putin assinou um pacote de leis que endureceu ainda mais o controle sobre a população LGBTQIAPN+ do país. A nova legislação proíbe a divulgação de qualquer ato ou informação que o governo considere uma “promoção da homossexualidade”, seja em espaços públicos, filmes ou plataformas online.
Casal está junto desde 2021
Reprodução/ Instagram
“O clima já era perigoso, mas piorou muito. Mesmo naquela época, a gente nunca se beijava na rua, mas agora está ainda pior. Antes tinham algumas iniciativas, eu tinha o meu canal, depois fiz um podcast com uma amiga sobre a comunidade queer, e precisávamos colocar avisos dizendo que era para maiores de idade”, lembra-se a escrita.
Depois da nova lei, qualquer forma de expressão se tornou “impossível” para elas. “Uma bandeira ou um símbolo, não podem ser mostrados na Rússia. Mesmo algo simples, como um bolo com um arco-íris, pode ser visto como ‘propaganda’. No último ano da nossa vida na Rússia, a gente basicamente vivia com um medo constante”.
Ekaterina teve seu trabalho como escritora censurado nas redes sociais, enquanto Olga, que era professora de literatura, convivia com o medo de ser denunciada pelos pais dos alunos. “A gente passou de um clima limitante para realmente um medo diário. Era uma incapacidade de se manifestar de qualquer forma. É um sentimento muito ruim, porque você sente que está completamente sozinha. Isso é agravado pelo fato de muitas pessoas LGBTQIAPN+ terem saído da Rússia. Depois da guerra, quase todos os nossos amigos foram embora”, lamenta.
A decisão de sair do país
Apesar do ambiente hostil, o casal ainda tentava manter a vida em Moscou, mesmo com o desejo de Olga de sair do país logo depois da eclosão da guerra no país. Ekaterina, por sua vez, retomou o contato com sua família, com quem não falava desde que havia se assumido como lésbica na adolescência.
“A guerra tem esse efeito. Ao mesmo tempo que nos divide, ela também aproxima, porque você se sente muito próximo da morte. Você quer fortalecer os laços afetivos que você tem. Aí comecei a viajar muito para minha cidade natal, e ficou muito difícil emocionalmente para mim”, conta. “Em algum momento, eu falei para a Olga: ‘Eu não quero sair. Não entendo por que eu preciso sair do meu país.”
Ela mudou de ideia no ano passado, após a morte de Alexei Navalny, um dos principais opositores do governo, e a polêmica reeleição de Vladimir Putin. “Foi justamente naquele momento que eu entendi que não é hora de agir, porque eu não quero passar a minha juventude vivendo com medo da minha própria liberdade e existência.”
Casal mora no litoral de São Paulo há 2 meses
Reprodução/ Instagram
As duas organizaram a imigração do país desde março. O destino sempre foi pensado no Brasil muito por conta da conexão de Ekaterina, que é fluente em português desde a faculdade e já visitou o país algumas vezes. A paixão pelo Brasil foi passada para sua namorada, que se empolgou e começou a gravar vídeos em português no perfil do TikTok nesse meio tempo.
O conteúdo viralizou: além de praticar a língua portuguesa, elas passaram a mostrar a rotina do casal que planejava a saída de sua terra natal. Depois de quase um ano, conseguiram se asilar no Brasil — há dois meses, fizeram seu lar em Caraguatatuba, no litoral de São Paulo. “Aqui já tínhamos uma rede de apoio”, explica a escritora, que havia conhecido a cidade com sua ex-namorada brasileira. Foi ela quem as ajudou em tudo que precisavam para se instalarem.
“Uma experiência que nunca vivemos antes”
Mesmo morando no Brasil há pouco tempo, o casal já sente a diferença de estar aqui, principalmente em relação a suas vivências como lésbicas. “Vai demorar um pouco para a gente se acostumar com isso. É muito diferente. Logo quando chegamos, decidimos ir tomar sol na praia, nadar, essas coisas. Lembro que tinha bastante gente na praia, estávamos nadando, e a Olga me abraçou e falou: “Agora podemos beijar, né?”.
Ekaterina conta que sua primeira reação foi “travar”. “Porque é tão automático bloquear qualquer tipo de afeto em público, que eu não conseguia nem dar um selinho. E eu fiquei emocionada, senti muitas emoções. Acho que não percebi muito bem esse sentimento até aquele momento. Você começa a perceber isso quando começa a comparar as situações.”
Para Olga, sua surpresa foi a liberdade para poder dizer que tem uma namorada. “É algo muito diferente, porque lá na Rússia, agora está cada vez mais próxima a chamada ‘cultura de denúncia’. A gente vivia com medo de ser denunciada pelos nossos vizinhos. Aqui eu posso dizer que somos namoradas dentro do condomínio. Nós, sendo estrangeiras, nos sentimos muito mais inseridas nessa cidade aqui do que na Rússia, que é o nosso país natal”, observa.
“O mais importante é isso: você se sentir parte da comunidade, que é normal, que é natural. Claro que sempre terão pessoas que não gostam, e a gente vê muito disso nas redes sociais, com muitos brasileiros falando: ‘Aqui também está tudo complicado’. Mas eu sempre digo que não tem como comparar”.
As russas entendem “muito bem” que há homofobia no Brasil. “A gente entende, não estamos vivendo em um país idealizado. Mas a homofobia existe em todo lugar do mundo, acho que isso é algo universal. Vindo de um lugar tão discriminatório e opressivo quanto a Rússia, é muito diferente”.
“Por exemplo, esses dias eu ouvi que aqui, uma cidade pequena no litoral de São Paulo, foi aberta uma agência de viagens para pessoas LGBTQIAPN+. Ela organiza excursões para o show da Lady Gaga, para o Festival Hopi Pride. Para nós é até difícil acreditar que isso existe, sabe? Realmente, para a gente, está sendo uma experiência que nunca vivemos antes”.
O sentimento é descrito em um dos vídeos mais recentes que viralizaram. No registro, elas aparecem sorrindo em uma piscina, enquanto resumem o que significa essa nova fase: “Somos um casal lésbico russo. Mudamos pro Brasil há dois meses e nunca fomos tão felizes. Na Rússia, passamos medo de ser denunciadas como LGBTQIA+ e acabar na cadeia todo santo dia. Agora, viver sem este medo é uma sensação incrível. A vida presta.”
Russas viralizaram ao comentar experiência no Brasil
Reprodução/ TikTok
Ekaterina e Olga enfrentaram a repressão na Rússia por viverem um amor lésbico, especialmente após o endurecimento das leis contra a comunidade LGBTQIAPN+. Há dois meses no Brasil, as duas celebram a liberdade de demonstrar seu amor publicamente, algo impossível em seu país natal: ‘A gente basicamente vivia com um medo constante’ As russas Ekaterina Nenakhova, 30 e Olga Osipova, 25, dizem que nunca conseguiram viver o relacionamento com liberdade em seu país natal. Foi somente quando desembarcaram no Brasil, há dois meses, que as escritoras começaram a perder o medo de poder demonstrar o seu amor em público. A Marie Claire, as duas contam como se tornar um viral no TikTok brasileiro as fizeram tomar coragem para imigrarem de vez.
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O casal se conheceu em 2021 e logo iniciou o namoro. “É uma clássica história ‘sapatônica’”, brinca Ekaterina, que participou de um concurso de histórias LGBTQIAPN+ do qual Olga era jurada. “Eu sabia quem era porque ela [Ekaterina] era muito popular no meio queer, tinha até um canal no YouTube. Li o texto em anônimo para não influenciar o processo. Mas, mesmo assim, eu percebi que era dela. Foi o único que falava sobre corpo, sobre segurança, sobre ser quem você é”, revela a parceira.
Olguinha, como é chamada pela namorada, tomou a iniciativa ao mandar mensagem para a escritora logo após o concurso. O flerte deu certo e, cerca de dois meses depois, já estavam morando juntas. No entanto, o simples fato de estarem apaixonadas se tornou um desafio constante pelas leis do país.
Desde 2013, existe uma lei na Rússia que proíbe a “propaganda” que poderia promover “relações e/ou preferências sexuais não tradicionais”, sob a justificativa de proteger “valores tradicionais”. “O que acontecia quando a gente se conheceu, é que todas as atividades LGBTQIAPN+, por exemplo, tinham restrição para maiores de idade. Existiam até baladas gays em Moscou, mais restritas, porém existiam”, diz Ekaterina.
Com a guerra na Ucrânia, a repressão se intensificou: o presidente Vladimir Putin assinou um pacote de leis que endureceu ainda mais o controle sobre a população LGBTQIAPN+ do país. A nova legislação proíbe a divulgação de qualquer ato ou informação que o governo considere uma “promoção da homossexualidade”, seja em espaços públicos, filmes ou plataformas online.
Casal está junto desde 2021
Reprodução/ Instagram
“O clima já era perigoso, mas piorou muito. Mesmo naquela época, a gente nunca se beijava na rua, mas agora está ainda pior. Antes tinham algumas iniciativas, eu tinha o meu canal, depois fiz um podcast com uma amiga sobre a comunidade queer, e precisávamos colocar avisos dizendo que era para maiores de idade”, lembra-se a escrita.
Depois da nova lei, qualquer forma de expressão se tornou “impossível” para elas. “Uma bandeira ou um símbolo, não podem ser mostrados na Rússia. Mesmo algo simples, como um bolo com um arco-íris, pode ser visto como ‘propaganda’. No último ano da nossa vida na Rússia, a gente basicamente vivia com um medo constante”.
Ekaterina teve seu trabalho como escritora censurado nas redes sociais, enquanto Olga, que era professora de literatura, convivia com o medo de ser denunciada pelos pais dos alunos. “A gente passou de um clima limitante para realmente um medo diário. Era uma incapacidade de se manifestar de qualquer forma. É um sentimento muito ruim, porque você sente que está completamente sozinha. Isso é agravado pelo fato de muitas pessoas LGBTQIAPN+ terem saído da Rússia. Depois da guerra, quase todos os nossos amigos foram embora”, lamenta.
A decisão de sair do país
Apesar do ambiente hostil, o casal ainda tentava manter a vida em Moscou, mesmo com o desejo de Olga de sair do país logo depois da eclosão da guerra no país. Ekaterina, por sua vez, retomou o contato com sua família, com quem não falava desde que havia se assumido como lésbica na adolescência.
“A guerra tem esse efeito. Ao mesmo tempo que nos divide, ela também aproxima, porque você se sente muito próximo da morte. Você quer fortalecer os laços afetivos que você tem. Aí comecei a viajar muito para minha cidade natal, e ficou muito difícil emocionalmente para mim”, conta. “Em algum momento, eu falei para a Olga: ‘Eu não quero sair. Não entendo por que eu preciso sair do meu país.”
Ela mudou de ideia no ano passado, após a morte de Alexei Navalny, um dos principais opositores do governo, e a polêmica reeleição de Vladimir Putin. “Foi justamente naquele momento que eu entendi que não é hora de agir, porque eu não quero passar a minha juventude vivendo com medo da minha própria liberdade e existência.”
Casal mora no litoral de São Paulo há 2 meses
Reprodução/ Instagram
As duas organizaram a imigração do país desde março. O destino sempre foi pensado no Brasil muito por conta da conexão de Ekaterina, que é fluente em português desde a faculdade e já visitou o país algumas vezes. A paixão pelo Brasil foi passada para sua namorada, que se empolgou e começou a gravar vídeos em português no perfil do TikTok nesse meio tempo.
O conteúdo viralizou: além de praticar a língua portuguesa, elas passaram a mostrar a rotina do casal que planejava a saída de sua terra natal. Depois de quase um ano, conseguiram se asilar no Brasil — há dois meses, fizeram seu lar em Caraguatatuba, no litoral de São Paulo. “Aqui já tínhamos uma rede de apoio”, explica a escritora, que havia conhecido a cidade com sua ex-namorada brasileira. Foi ela quem as ajudou em tudo que precisavam para se instalarem.
“Uma experiência que nunca vivemos antes”
Mesmo morando no Brasil há pouco tempo, o casal já sente a diferença de estar aqui, principalmente em relação a suas vivências como lésbicas. “Vai demorar um pouco para a gente se acostumar com isso. É muito diferente. Logo quando chegamos, decidimos ir tomar sol na praia, nadar, essas coisas. Lembro que tinha bastante gente na praia, estávamos nadando, e a Olga me abraçou e falou: “Agora podemos beijar, né?”.
Ekaterina conta que sua primeira reação foi “travar”. “Porque é tão automático bloquear qualquer tipo de afeto em público, que eu não conseguia nem dar um selinho. E eu fiquei emocionada, senti muitas emoções. Acho que não percebi muito bem esse sentimento até aquele momento. Você começa a perceber isso quando começa a comparar as situações.”
Para Olga, sua surpresa foi a liberdade para poder dizer que tem uma namorada. “É algo muito diferente, porque lá na Rússia, agora está cada vez mais próxima a chamada ‘cultura de denúncia’. A gente vivia com medo de ser denunciada pelos nossos vizinhos. Aqui eu posso dizer que somos namoradas dentro do condomínio. Nós, sendo estrangeiras, nos sentimos muito mais inseridas nessa cidade aqui do que na Rússia, que é o nosso país natal”, observa.
“O mais importante é isso: você se sentir parte da comunidade, que é normal, que é natural. Claro que sempre terão pessoas que não gostam, e a gente vê muito disso nas redes sociais, com muitos brasileiros falando: ‘Aqui também está tudo complicado’. Mas eu sempre digo que não tem como comparar”.
As russas entendem “muito bem” que há homofobia no Brasil. “A gente entende, não estamos vivendo em um país idealizado. Mas a homofobia existe em todo lugar do mundo, acho que isso é algo universal. Vindo de um lugar tão discriminatório e opressivo quanto a Rússia, é muito diferente”.
“Por exemplo, esses dias eu ouvi que aqui, uma cidade pequena no litoral de São Paulo, foi aberta uma agência de viagens para pessoas LGBTQIAPN+. Ela organiza excursões para o show da Lady Gaga, para o Festival Hopi Pride. Para nós é até difícil acreditar que isso existe, sabe? Realmente, para a gente, está sendo uma experiência que nunca vivemos antes”.
O sentimento é descrito em um dos vídeos mais recentes que viralizaram. No registro, elas aparecem sorrindo em uma piscina, enquanto resumem o que significa essa nova fase: “Somos um casal lésbico russo. Mudamos pro Brasil há dois meses e nunca fomos tão felizes. Na Rússia, passamos medo de ser denunciadas como LGBTQIA+ e acabar na cadeia todo santo dia. Agora, viver sem este medo é uma sensação incrível. A vida presta.”
Russas viralizaram ao comentar experiência no Brasil
Reprodução/ TikTok