Com a morte do papa Francisco, aos 88 anos, nessa segunda-feira (21/4), a Igreja Católica entra em um novo capítulo da sua longa história. Líder progressista e reformador, Francisco foi o primeiro pontífice vindo da América Latina e, durante 12 anos de pontificado, promoveu uma profunda reconfiguração da Igreja — tanto na sua estrutura interna quanto na sua atuação no mundo.
Morte de papa Francisco
- O papa Francisco morreu, aos 88 anos, na madrugada dessa segunda-feira (21/4), em sua residência oficial na Casa Santa Marta, no Vaticano.
- O pontífice ficou internado por cerca de 40 dias após uma pneumonia dupla. Nesse sábado (19/4), ele apareceu em público, na basílica de São Pedro, no Vaticano.
- O religioso passou por vários problemas respiratórios desde a juventude – chegando a ter parte de um dos pulmões removido – e passou por internações recentes.
- “Com profunda dor devo anunciar a morte do nosso Santo Padre Francisco às 7h35 desta manhã, o bispo de Roma Francisco voltou para a Casa do Pai”, discursou o cardeal Kevin Joseph Farrell.
No horizonte da escolha do novo papa, paira uma dúvida: o próximo pontífice dará continuidade à linha de Francisco ou representará uma guinada conservadora? A resposta passa não só pelo perfil dos cardeais cotados para sucedê-lo, mas também pelas tensões internas e desafios que cercam a Igreja no século 21.
Durante seu pontificado, Francisco adotou um estilo pastoral voltado à simplicidade e ao diálogo com os mais vulneráveis. Incentivou uma “Igreja em saída”, mais próxima dos pobres e atenta às grandes questões sociais. Entre suas posturas mais notáveis estiveram a defesa da causa ambiental, a abertura ao acolhimento de pessoas LGBTQIA+ e críticas a políticas anti-imigração.
Internamente, enfrentou resistência de setores conservadores que questionaram suas reformas. No plano institucional, uma de suas principais marcas foi a reformulação do Colégio de Cardeais. Francisco ampliou a representatividade de regiões como Ásia, África e América Latina, descentralizando a tradicional predominância europeia.
Hoje, 80% dos cardeais com direito a voto no conclave foram nomeados por Francisco. Essa reconfiguração, segundo o historiador Sérgio Coutinho, não é apenas geográfica — ela aponta para uma mudança de mentalidade.
“Ele tornou a Cúria Romana e o Colégio de Cardeais muito plural, muito diversificado”, afirma o historiador Sérgio Coutinho. “Me parece que isso vai ser determinante. A gente imagina que sejam cardeais escolhidos quase à sua imagem e semelhança. Eu estou apostando num Francisco II.”
Os nomes mais cotados
Entre os favoritos para o papado estão o filipino Luis Antonio Tagle, o ganês Peter Turkson, o italiano Matteo Zuppi e o húngaro Péter Erdő. Tagle é visto como um dos mais alinhados ao legado de Francisco — conhecido como o “Francisco das Filipinas”, é popular, tem perfil pastoral e representa a força crescente da Igreja na Ásia.
Turkson, por sua vez, seria um nome histórico: o primeiro papa negro. Com forte atuação em temas de justiça social, também simboliza a globalização da Igreja. Já Zuppi, arcebispo de Bolonha, ganhou destaque por sua atuação em missões de paz e é próximo ao falecido pontífice. Erdő, mais discreto, representa um setor mais tradicional e conservador da Igreja.
O cardeal dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, afirmou nessa segunda-feira (21/4) que a Igreja Católica vive um processo de crescente internacionalização e que não seria surpreendente a escolha de um papa africano ou asiático — o que seria inédito na história. Segundo ele, o colégio de cardeais está hoje muito mais diverso do que em décadas passadas, com significativa representação fora da Europa.
Dom Odilo, que participou do conclave que elegeu o papa Francisco em 2013 e chegou a ser cotado para o papado à época, destacou que essa abertura teve início nos anos 1950 e se intensificou com os papados de João Paulo II, Bento XVI e, especialmente, Francisco.
“O colégio dos cardeais era, sobretudo, italiano e europeu. Depois foi se abrindo mais. Hoje, realmente, é muito menos europeu”, afirmou. Ele ressaltou que a maioria dos cardeais atualmente vem da América Latina, América do Norte, África e Ásia, o que poderá influenciar a escolha do próximo pontífice.
No Brasil, nomes como dom Leonardo Steiner e dom Paulo Cezar Costa surgem como possibilidades, embora menos prováveis. O país, maior nação católica do mundo, terá sete cardeais votantes — um número relevante, mas não determinante.
O que está em jogo
A escolha do novo papa ocorrerá em um momento de transição delicado. A Igreja enfrenta desafios globais: queda no número de fiéis no Ocidente, perda de relevância política e moral, escândalos de abuso sexual e tensões internas entre alas progressistas e conservadoras.
Para Coutinho, o novo papa precisará manter o espírito pastoral e missionário que Francisco imprimiu à Igreja. “Um papa inserido na sociedade, no mundo dos marginalizados, pregando a paz, e não entrando numa característica moralista rígida. Mais acolhedor do que acusador.”
No entanto, ele reconhece que há pressões contrárias: “Existem grupos minoritários bastante influentes que têm feito carga contra o modo como Francisco governou a Igreja. Eles gostariam que a Igreja voltasse à linha de João Paulo II e Bento XVI. Mas isso seria um retrocesso histórico.”
Esses grupos, embora em minoria, desejam uma Igreja mais vertical, normativa e distante das transformações sociais. Ainda assim, segundo o historiador, com a maioria dos cardeais escolhidos por Francisco, a expectativa é de que esse conservadorismo tenha dificuldades em prevalecer.
Continuidade ou ruptura?
De acordo com Sérgio Coutinho, a força simbólica e política de Francisco é tamanha que seu sucessor terá de lidar com o peso de sua herança. Mesmo que o novo papa seja de outro continente, como Ásia ou África, “vai ter um rosto ou uma prática parecida com o de Francisco.”
A escolha de um pontífice mais jovem pode ser estratégica, oferecendo um papado mais longo e estável. Mas mais importante do que a idade será o perfil pastoral, a abertura ao diálogo e a disposição de continuar — ou não — as reformas iniciadas.
Com o colégio cardinalício moldado por Francisco, as chances de continuidade são reais. “Pode ser que venha um continuador da sua proposta”, diz Coutinho. “A lógica é dar profundidade àquilo que foi iniciado.”
Com a morte do papa Francisco, aos 88 anos, nessa segunda-feira (21/4), a Igreja Católica entra em um novo capítulo da sua longa história. Líder progressista e reformador, Francisco foi o primeiro pontífice vindo da América Latina e, durante 12 anos de pontificado, promoveu uma profunda reconfiguração da Igreja — tanto na sua estrutura interna quanto na sua atuação no mundo.
Morte de papa Francisco
- O papa Francisco morreu, aos 88 anos, na madrugada dessa segunda-feira (21/4), em sua residência oficial na Casa Santa Marta, no Vaticano.
- O pontífice ficou internado por cerca de 40 dias após uma pneumonia dupla. Nesse sábado (19/4), ele apareceu em público, na basílica de São Pedro, no Vaticano.
- O religioso passou por vários problemas respiratórios desde a juventude – chegando a ter parte de um dos pulmões removido – e passou por internações recentes.
- “Com profunda dor devo anunciar a morte do nosso Santo Padre Francisco às 7h35 desta manhã, o bispo de Roma Francisco voltou para a Casa do Pai”, discursou o cardeal Kevin Joseph Farrell.
No horizonte da escolha do novo papa, paira uma dúvida: o próximo pontífice dará continuidade à linha de Francisco ou representará uma guinada conservadora? A resposta passa não só pelo perfil dos cardeais cotados para sucedê-lo, mas também pelas tensões internas e desafios que cercam a Igreja no século 21.
Durante seu pontificado, Francisco adotou um estilo pastoral voltado à simplicidade e ao diálogo com os mais vulneráveis. Incentivou uma “Igreja em saída”, mais próxima dos pobres e atenta às grandes questões sociais. Entre suas posturas mais notáveis estiveram a defesa da causa ambiental, a abertura ao acolhimento de pessoas LGBTQIA+ e críticas a políticas anti-imigração.
Internamente, enfrentou resistência de setores conservadores que questionaram suas reformas. No plano institucional, uma de suas principais marcas foi a reformulação do Colégio de Cardeais. Francisco ampliou a representatividade de regiões como Ásia, África e América Latina, descentralizando a tradicional predominância europeia.
Hoje, 80% dos cardeais com direito a voto no conclave foram nomeados por Francisco. Essa reconfiguração, segundo o historiador Sérgio Coutinho, não é apenas geográfica — ela aponta para uma mudança de mentalidade.
“Ele tornou a Cúria Romana e o Colégio de Cardeais muito plural, muito diversificado”, afirma o historiador Sérgio Coutinho. “Me parece que isso vai ser determinante. A gente imagina que sejam cardeais escolhidos quase à sua imagem e semelhança. Eu estou apostando num Francisco II.”
Os nomes mais cotados
Entre os favoritos para o papado estão o filipino Luis Antonio Tagle, o ganês Peter Turkson, o italiano Matteo Zuppi e o húngaro Péter Erdő. Tagle é visto como um dos mais alinhados ao legado de Francisco — conhecido como o “Francisco das Filipinas”, é popular, tem perfil pastoral e representa a força crescente da Igreja na Ásia.
Turkson, por sua vez, seria um nome histórico: o primeiro papa negro. Com forte atuação em temas de justiça social, também simboliza a globalização da Igreja. Já Zuppi, arcebispo de Bolonha, ganhou destaque por sua atuação em missões de paz e é próximo ao falecido pontífice. Erdő, mais discreto, representa um setor mais tradicional e conservador da Igreja.
O cardeal dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, afirmou nessa segunda-feira (21/4) que a Igreja Católica vive um processo de crescente internacionalização e que não seria surpreendente a escolha de um papa africano ou asiático — o que seria inédito na história. Segundo ele, o colégio de cardeais está hoje muito mais diverso do que em décadas passadas, com significativa representação fora da Europa.
Dom Odilo, que participou do conclave que elegeu o papa Francisco em 2013 e chegou a ser cotado para o papado à época, destacou que essa abertura teve início nos anos 1950 e se intensificou com os papados de João Paulo II, Bento XVI e, especialmente, Francisco.
“O colégio dos cardeais era, sobretudo, italiano e europeu. Depois foi se abrindo mais. Hoje, realmente, é muito menos europeu”, afirmou. Ele ressaltou que a maioria dos cardeais atualmente vem da América Latina, América do Norte, África e Ásia, o que poderá influenciar a escolha do próximo pontífice.
No Brasil, nomes como dom Leonardo Steiner e dom Paulo Cezar Costa surgem como possibilidades, embora menos prováveis. O país, maior nação católica do mundo, terá sete cardeais votantes — um número relevante, mas não determinante.
O que está em jogo
A escolha do novo papa ocorrerá em um momento de transição delicado. A Igreja enfrenta desafios globais: queda no número de fiéis no Ocidente, perda de relevância política e moral, escândalos de abuso sexual e tensões internas entre alas progressistas e conservadoras.
Para Coutinho, o novo papa precisará manter o espírito pastoral e missionário que Francisco imprimiu à Igreja. “Um papa inserido na sociedade, no mundo dos marginalizados, pregando a paz, e não entrando numa característica moralista rígida. Mais acolhedor do que acusador.”
No entanto, ele reconhece que há pressões contrárias: “Existem grupos minoritários bastante influentes que têm feito carga contra o modo como Francisco governou a Igreja. Eles gostariam que a Igreja voltasse à linha de João Paulo II e Bento XVI. Mas isso seria um retrocesso histórico.”
Esses grupos, embora em minoria, desejam uma Igreja mais vertical, normativa e distante das transformações sociais. Ainda assim, segundo o historiador, com a maioria dos cardeais escolhidos por Francisco, a expectativa é de que esse conservadorismo tenha dificuldades em prevalecer.
Continuidade ou ruptura?
De acordo com Sérgio Coutinho, a força simbólica e política de Francisco é tamanha que seu sucessor terá de lidar com o peso de sua herança. Mesmo que o novo papa seja de outro continente, como Ásia ou África, “vai ter um rosto ou uma prática parecida com o de Francisco.”
A escolha de um pontífice mais jovem pode ser estratégica, oferecendo um papado mais longo e estável. Mas mais importante do que a idade será o perfil pastoral, a abertura ao diálogo e a disposição de continuar — ou não — as reformas iniciadas.
Com o colégio cardinalício moldado por Francisco, as chances de continuidade são reais. “Pode ser que venha um continuador da sua proposta”, diz Coutinho. “A lógica é dar profundidade àquilo que foi iniciado.”