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5 May 2025, Mon

Fraude no INSS rouba R$ 2,87 bilhões de aposentados rurais, aponta PF

Previdencia social seguro inss aposentadoria


A investigação da Polícia Federal revelou um esquema de fraudes que atingiu milhões de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com prejuízos estimados em R$ 2,87 bilhões apenas para beneficiários da zona rural. Esses aposentados, que representam 67% das vítimas, sofreram descontos indevidos em seus benefícios entre 2019 e 2024. A dificuldade de acesso a canais digitais, como o aplicativo Meu INSS, foi um dos fatores que facilitaram a ação criminosa. A operação, batizada de Sem Desconto, expôs a vulnerabilidade de idosos, especialmente em áreas rurais, onde o acesso à tecnologia é limitado.

O esquema envolveu associações e sindicatos que, sob a fachada de oferecer serviços como assistência jurídica e descontos em saúde, realizavam cobranças não autorizadas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários. A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou que 97,6% dos aposentados entrevistados não autorizaram os descontos. A operação resultou na suspensão de Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com 11 entidades investigadas e no afastamento de servidores do INSS, incluindo o ex-presidente Alessandro Stefanutto.

Os números impressionam e revelam a escala do problema:

  • Prejuízo total estimado: R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
  • Aposentados rurais: 67% das vítimas, com R$ 2,87 bilhões desviados.
  • Aposentados urbanos: 33% das vítimas, com perdas proporcionais menores.
  • Entidades investigadas: 11 associações, com suspeitas sobre outras 20.

A gravidade do caso levou o governo a suspender todos os descontos associativos e prometeu ressarcir os valores cobrados indevidamente. A investigação, iniciada em 2023 pela CGU, ganhou força com a operação deflagrada em 23 de abril de 2025, que envolveu 211 mandados de busca e apreensão e seis prisões temporárias em 13 estados e no Distrito Federal.

Origem do esquema fraudulento

A fraude teve início em 2019, durante o governo Bolsonaro, quando os Acordos de Cooperação Técnica começaram a ser firmados em maior volume. Esses acordos permitiam que entidades associativas descontassem mensalidades diretamente dos benefícios, desde que houvesse autorização expressa dos aposentados. No entanto, a ausência de controles rigorosos e a possibilidade de falsificação de assinaturas abriram brechas para a ação criminosa. Em 2020, um decreto alterou as regras, exigindo autorização prévia e específica, mas as falhas de fiscalização persistiram.

A CGU constatou que muitas entidades não entregavam a documentação exigida para validar os descontos. Em 72% dos casos analisados, as associações não apresentaram os comprovantes necessários. Algumas, como a Caixa de Assistência dos Aposentados e Pensionistas do INSS (Caap), realizaram centenas de descontos irregulares, com 214 dos 215 casos auditados considerados indevidos. A falta de estrutura operacional dessas entidades também chamou a atenção: muitas não possuíam escritórios ou serviços reais, funcionando como fachadas para o desvio de recursos.

A investigação revelou que o esquema se intensificou a partir de 2023, já no governo Lula, quando os descontos associativos triplicaram, passando de R$ 706,2 milhões em 2022 para R$ 2,8 bilhões em 2024. A CGU identificou um aumento súbito no número de reclamações, com 192 mil pedidos de cancelamento de descontos registrados em abril de 2024. A demora do INSS em adotar medidas efetivas, mesmo após alertas, agravou a situação.

Vulnerabilidade dos aposentados rurais

Os aposentados da zona rural foram os mais afetados devido a barreiras específicas que dificultam o acompanhamento de seus benefícios. A falta de acesso à internet e a baixa familiaridade com plataformas digitais, como o aplicativo Meu INSS, deixaram esses beneficiários expostos. Muitos só percebiam os descontos ao consultar o contracheque, mas enfrentavam dificuldades para registrar reclamações ou bloquear as cobranças.

A CGU entrevistou 1.273 beneficiários entre abril e julho de 2024, em todas as unidades da federação. Os resultados mostram a gravidade do problema:

  • 97,6% dos entrevistados não autorizaram os descontos.
  • 95,9% afirmaram não participar de nenhuma associação.
  • 70% das entidades auditadas não apresentaram documentação válida.
  • A maioria das vítimas rurais é analfabeta ou tem baixa escolaridade.

A operação da Polícia Federal destacou que assinaturas de idosos com doenças incapacitantes e até de analfabetos foram fraudadas. Em muitos casos, os descontos eram pequenos, variando de R$ 10 a R$ 50 por mês, o que dificultava a percepção imediata do golpe. No entanto, a soma desses valores resultou em um prejuízo bilionário, afetando milhões de aposentados.

Ação da Polícia Federal e CGU

A operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril de 2025, marcou um ponto de virada na investigação. Cerca de 700 policiais federais e 80 servidores da CGU cumpriram 211 mandados de busca e apreensão em 34 municípios. A ação resultou na apreensão de R$ 41 milhões em bens, incluindo carros de luxo, joias, obras de arte e R$ 1,734 milhão em dinheiro vivo. Seis pessoas foram presas temporariamente, e cinco servidores do INSS, além de um policial federal, foram afastados.

A Polícia Federal identificou que o esquema contava com a participação de “funcionários laranjas” e movimentava milhões de reais por mês. Alessandro Stefanutto, então presidente do INSS, foi demitido no mesmo dia da operação. Outros servidores afastados incluíam o procurador-geral do INSS, Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, e o diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão, Vanderlei Barbosa dos Santos. A investigação ainda apura o grau de envolvimento de cada agente.

A CGU, por sua vez, realizou auditorias em 29 das 31 entidades suspeitas. O relatório apontou que 21 delas tinham 100% dos descontos considerados irregulares, enquanto outras sete apresentavam índices entre 71% e 99%. A operação também revelou que o INSS ignorou seis alertas de órgãos de controle, permitindo que o esquema continuasse a crescer.

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rafastockbr/shutterstock.com

Entidades investigadas

Pelo menos 11 entidades associativas foram alvos de medidas judiciais, e outras 20 estão sob suspeita. Essas organizações formalizavam Acordos de Cooperação Técnica com o INSS, mas muitas não cumpriam as exigências legais. Algumas entidades prometiam serviços como auxílio jurídico, descontos em academias e planos de saúde, mas não tinham infraestrutura para entregá-los.

Entre as entidades investigadas, destacam-se:

  • Ambec: Suspeita de 87 descontos indevidos.
  • AAPB: Realizou 82 descontos sem autorização.
  • Unabrasil: Acusada de 72 descontos irregulares.
  • Caap: 214 dos 215 descontos auditados foram considerados fraudulentos.
  • Sindnapi: Vice-presidida por José Ferreira da Silva, irmão do presidente Lula, nega irregularidades.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) também está entre as investigadas, apesar de ter solicitado, em 2024, o desbloqueio em lote de descontos, contrariando normas do INSS. A suspensão dos ACTs dessas entidades foi uma das primeiras medidas tomadas pelo governo após a operação.

Impacto nas vítimas urbanas

Embora os aposentados rurais sejam a maioria, os beneficiários urbanos representam 33% das vítimas, com prejuízos proporcionais ao total de R$ 6,3 bilhões. Diferentemente das áreas rurais, os aposentados urbanos têm maior acesso a canais digitais, mas muitos foram enganados por campanhas de filiação fraudulentas. A falsificação de assinaturas e a falta de verificação rigorosa das autorizações também afetaram esse grupo.

Em áreas urbanas, as entidades investigadas usavam estratégias como ligações telefônicas e propagandas enganosas para atrair associados. Muitos aposentados relataram dificuldades para bloquear os descontos, mesmo após identificarem as cobranças. A Central 135, principal canal de atendimento do INSS, recebeu milhares de reclamações, mas a lentidão na resolução dos casos frustrou os beneficiários.

A CGU constatou que, em 2024, o número de pedidos de revisão de descontos atingiu 190 mil, um aumento significativo em relação aos 22 mil registrados em julho de 2023. A operação da Polícia Federal revelou que algumas entidades continuaram a operar mesmo após denúncias, aproveitando a burocracia do INSS.

Medidas de proteção aos beneficiários

O governo anunciou a suspensão de todos os descontos associativos e a criação de mecanismos para ressarcir as vítimas. Os aposentados que identificarem cobranças indevidas podem solicitar a exclusão do débito pelo aplicativo Meu INSS ou pela Central 135. O processo, no entanto, exige acesso a login Gov.br e consulta ao extrato de benefício, o que pode ser um obstáculo para idosos rurais.

Para bloquear os descontos, os beneficiários devem:

  • Acessar o Meu INSS e consultar o extrato de pagamento.
  • Identificar mensalidades associativas não autorizadas.
  • Solicitar a exclusão do débito no aplicativo ou pela Central 135.
  • Registrar reclamações no Portal Consumidor.gov ou na Ouvidoria do INSS.
  • Contatar a entidade responsável pelo desconto para exigir o estorno.

O INSS também passou a exigir assinatura eletrônica avançada e biometria para novos descontos, com implementação do sistema biométrico da Dataprev em fevereiro de 2025. Essas medidas visam aumentar a segurança, mas ainda enfrentam desafios para alcançar os beneficiários rurais.

Falhas de fiscalização do INSS

A investigação apontou que o INSS foi omisso ao ignorar alertas de órgãos de controle. Desde 2019, o Tribunal de Contas da União (TCU) já indicava falhas nos controles dos Acordos de Cooperação Técnica. Em 2023, o Sindnapi, por meio de sua coordenadora jurídica, denunciou irregularidades ao Conselho Nacional da Previdência Social, mas as medidas demoraram a ser implementadas.

A Polícia Federal revelou que o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, autorizou o desbloqueio em lote de descontos em 2024, contrariando pareceres da Procuradoria Federal. A direção do INSS também assinou novos acordos com entidades suspeitas, mesmo após o início das investigações. A CGU apontou que a falta de capacidade operacional do INSS para monitorar os ACTs contribuiu para o crescimento do esquema.

Em resposta, o governo anunciou a indicação de um novo presidente para o INSS, a ser escolhido diretamente pelo presidente Lula. O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, negou omissão, mas reconheceu a demora na adoção de medidas efetivas. A exoneração de André Fidelis, ex-diretor de Benefícios, em maio de 2024, foi uma das ações tomadas após denúncias de letargia.

Repercussão política

O escândalo gerou forte repercussão no Congresso Nacional, com a oposição protocolando, em 30 de abril de 2025, um pedido para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). O Partido Liberal (PL) argumenta que a fraude, embora iniciada em 2019, cresceu significativamente no governo Lula, com 60% dos descontos realizados nos últimos dois anos. Parlamentares governistas, por sua vez, destacam que a investigação só avançou na atual gestão.

A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) protocolou uma indicação solicitando a abertura de um crédito extraordinário de R$ 6,3 bilhões para ressarcir as vítimas. O recurso, segundo a parlamentar, seria destinado a mitigar os danos materiais e psicológicos causados pelo esquema. A proposta ainda está em análise pelo governo federal.

A presença de José Ferreira da Silva, conhecido como Frei Chico, irmão do presidente Lula, como vice-presidente do Sindnapi, também alimentou debates políticos. A entidade nega irregularidades e afirma que atua com transparência, mas a relação familiar gerou críticas da oposição.

Aumento dos descontos

Os descontos associativos cresceram exponencialmente nos últimos anos, segundo a CGU. Em 2021, o total foi de R$ 536,3 milhões, subindo para R$ 1,3 bilhão em 2023 e com projeção de R$ 2,6 bilhões em 2024, antes da suspensão dos ACTs. A investigação revelou que o aumento foi impulsionado pela facilidade de falsificar autorizações e pela falta de verificação biométrica.

Entre janeiro de 2023 e março de 2025, mais de 3,5 milhões de descontos não reconhecidos foram registrados. A CGU destacou que muitas entidades usavam empresas terceirizadas para captar associados, o que aumentava o risco de fraudes. A Ambec, por exemplo, atribuiu os descontos indevidos a “erros de afiliação” cometidos por terceiros, prometendo ressarcir os valores em dobro.

A Polícia Federal também identificou movimentações financeiras suspeitas, com entidades transferindo milhões de reais para contas de pessoas físicas e empresas ligadas aos investigados. A apreensão de bens, como carros de luxo e joias, reforça a suspeita de enriquecimento ilícito.

Medidas preventivas

Para evitar novas fraudes, o INSS implementou mudanças nas regras de descontos associativos. A Instrução Normativa 162, publicada em 14 de março de 2024, condicionou novos descontos à adoção de tecnologias de assinatura eletrônica avançada e biometria. A Dataprev, responsável pela gestão de dados do INSS, passou a testar o sistema biométrico em maio de 2024, com implementação total em fevereiro de 2025.

Os beneficiários agora podem bloquear descontos diretamente no Meu INSS, mas o processo ainda exige acesso digital. Para os aposentados rurais, o governo estuda parcerias com agências do INSS e prefeituras para facilitar o atendimento presencial. A Central 135 também foi reforçada para atender às reclamações, mas a alta demanda tem gerado filas e atrasos.

A CGU recomendou a revisão de todos os ACTs firmados desde 2019 e a criação de um sistema de monitoramento em tempo real para identificar descontos suspeitos. A Polícia Federal, por sua vez, continua investigando possíveis ramificações do esquema, incluindo a participação de servidores públicos e empresas privadas.

Perfil das vítimas

A maioria das vítimas é composta por idosos com mais de 60 anos, muitos dos quais dependem exclusivamente do benefício do INSS para sobreviver. Na zona rural, a prevalência de analfabetismo e a falta de acesso à internet dificultaram a identificação dos descontos. Em áreas urbanas, os aposentados foram alvos de campanhas enganosas, com promessas de benefícios inexistentes.

A CGU constatou que muitos beneficiários só perceberam os descontos após meses ou anos, devido ao valor relativamente baixo das mensalidades. Em alguns casos, as vítimas tentaram bloquear as cobranças, mas enfrentaram barreiras burocráticas. A operação Sem Desconto revelou que o esquema explorava a vulnerabilidade social e econômica dos aposentados, especialmente em regiões mais pobres.

A Polícia Federal também identificou que o esquema afetou pensionistas e beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC), ampliando o alcance do prejuízo. A investigação segue para determinar o número exato de vítimas e o valor total desviado.

Ações judiciais

A Justiça Federal autorizou a operação Sem Desconto e determinou o sequestro de bens no valor de R$ 1 bilhão. A Polícia Federal continua analisando documentos apreendidos para identificar outros envolvidos. Até o momento, cinco pessoas permanecem presas, e uma está foragida. A investigação também apura a participação de um policial federal que teria dado suporte ao grupo.

Os beneficiários prejudicados podem buscar ressarcimento diretamente com as entidades responsáveis, mas muitas não oferecem canais de atendimento confiáveis. O INSS orienta que as reclamações sejam registradas no Portal Consumidor.gov ou na Ouvidoria, mas o processo de estorno pode levar meses. A CGU estima que o ressarcimento total dependerá da recuperação dos bens apreendidos e da responsabilização das entidades.

A operação também gerou ações civis públicas, com pedidos de indenização coletiva para as vítimas. O Ministério Público Federal acompanha o caso e avalia a possibilidade de novas medidas judiciais contra o INSS por omissão.

Papel das associações

As associações investigadas usavam a promessa de benefícios atraentes para captar associados, mas muitas não entregavam os serviços anunciados. A Polícia Federal constatou que algumas entidades operavam com endereços fictícios ou sem qualquer estrutura física. A Caap, por exemplo, não disponibilizava telefone ou e-mail para contato, dificultando reclamações.

A Ambec, uma das 11 entidades alvos, afirmou que os descontos indevidos resultaram de erros cometidos por empresas terceirizadas. A Unabrasil, por sua vez, destacou que possui um programa de compliance e negou irregularidades. O Sindnapi, ligado ao irmão do presidente Lula, afirmou que sempre atuou com autorizações formais e apoiou as investigações.

A CGU recomendou que o INSS revise os critérios para firmar novos ACTs, exigindo maior transparência das entidades. A suspensão dos acordos vigentes foi prorrogada até a conclusão das investigações, mas o governo ainda não definiu como serão tratados os contratos futuros.

Reuniões com entidades suspeitas

O Poder360 revelou que, entre janeiro de 2023 e março de 2025, representantes do governo federal se reuniram 15 vezes com entidades investigadas. Os encontros ocorreram nos ministérios da Previdência Social, do Desenvolvimento Social e no próprio INSS. O levantamento considerou apenas reuniões registradas oficialmente, mas outros encontros podem ter ocorrido sem registro.

Os compromissos envolveram discussões sobre benefícios previdenciários e assistenciais, incluindo o BPC. A frequência dos encontros, com oito em 2023, cinco em 2024 e dois em 2025, levantou questionamentos sobre a proximidade entre o governo e as entidades suspeitas. A CGU destacou que a falta de controles internos facilitou a continuidade do esquema, mesmo após denúncias.

A investigação também apura se houve favorecimento político nas negociações com as entidades. A presença de figuras ligadas ao governo, como o vice-presidente do Sindnapi, intensificou o debate sobre a transparência nas relações entre o INSS e as associações.

Propostas de reparação

A proposta de Fernanda Melchionna para um crédito extraordinário de R$ 6,3 bilhões ainda não foi avaliada pelo governo. A medida, se aprovada, seria usada para ressarcir os beneficiários e oferecer apoio psicológico às vítimas. A CGU estima que o processo de reparação será complexo, devido ao grande número de aposentados afetados e à dificuldade de rastrear os valores desviados.

O INSS anunciou que está revisando os extratos de pagamento de todos os beneficiários para identificar descontos indevidos. A prioridade é garantir o estorno automático para os casos confirmados, mas a implementação depende de sistemas digitais que ainda não alcançam todos os aposentados. O governo também estuda a criação de um fundo emergencial para atender as vítimas mais vulneráveis.

A Polícia Federal continua investigando as contas bancárias das entidades e dos servidores envolvidos. A recuperação dos R$ 41 milhões em bens apreendidos será destinada, em parte, ao ressarcimento dos beneficiários. No entanto, a CGU alerta que o valor total desviado pode ser maior do que o estimado, devido à falta de controles precisos no INSS.

Avanços na segurança digital

A implementação do sistema biométrico da Dataprev é uma das principais apostas para evitar novas fraudes. O sistema, testado desde maio de 2024, passou a ser obrigatório em fevereiro de 2025 para todos os descontos associativos. A tecnologia exige validação por reconhecimento facial ou impressão digital, reduzindo o risco de falsificações.

O INSS também lançou campanhas de conscientização para orientar os beneficiários sobre como consultar o extrato de pagamento e identificar cobranças suspeitas. As ações incluem parcerias com rádios comunitárias e lideranças locais nas áreas rurais, visando alcançar os idosos mais isolados. Apesar dos avanços, a dependência de canais digitais ainda é um obstáculo para muitos aposentados.

A CGU recomendou a criação de um canal de atendimento exclusivo para denúncias de fraudes, com equipes treinadas para orientar os beneficiários. O INSS estuda a proposta, mas a implementação depende de recursos adicionais e de mudanças na estrutura do órgão.

Cronologia do escândalo

A fraude no INSS seguiu uma trajetória marcada por falhas de fiscalização e aumento progressivo dos descontos. Os principais marcos incluem:

  • 2019: Início dos Acordos de Cooperação Técnica em maior volume, sob o governo Bolsonaro.
  • 2020: Decreto nº 10.410 exige autorização prévia para descontos, mas controles seguem frágeis.
  • 2023: CGU inicia investigações após aumento de reclamações; Sindnapi denuncia irregularidades.
  • Abril de 2024: 192 mil pedidos de cancelamento de descontos registrados.
  • 23 de abril de 2025: Operação Sem Desconto é deflagrada, com prisões e apreensões.

A investigação revelou que o esquema se aproveitou de brechas regulatórias e da vulnerabilidade dos beneficiários. A CGU estima que, sem a operação, os descontos poderiam atingir R$ 2,6 bilhões em 2024. A suspensão dos ACTs e a prisão dos envolvidos marcaram o início de uma resposta mais contundente ao problema.

Próximos passos da investigação

A Polícia Federal planeja novas fases da operação Sem Desconto, com foco na identificação de outros servidores e empresas envolvidas. A análise dos documentos apreendidos deve revelar o fluxo financeiro do esquema e possíveis conexões com agentes externos. A CGU, por sua vez, prepara um relatório final com recomendações para reformar o sistema de descontos associativos do INSS.

O Congresso Nacional acompanha o caso de perto, com a possibilidade de abertura de uma CPI ainda em 2025. A pressão por transparência e punição dos responsáveis cresce, especialmente entre os parlamentares da oposição. O governo, por sua vez, busca acelerar o ressarcimento das vítimas para minimizar o desgaste político.

A investigação também deve esclarecer o papel de empresas terceirizadas, que atuavam como intermediárias na captação de associados. A CGU identificou que essas empresas recebiam comissões por cada desconto realizado, o que incentivava a prática de fraudes. A responsabilização dessas organizações será um dos focos das próximas etapas.







A investigação da Polícia Federal revelou um esquema de fraudes que atingiu milhões de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com prejuízos estimados em R$ 2,87 bilhões apenas para beneficiários da zona rural. Esses aposentados, que representam 67% das vítimas, sofreram descontos indevidos em seus benefícios entre 2019 e 2024. A dificuldade de acesso a canais digitais, como o aplicativo Meu INSS, foi um dos fatores que facilitaram a ação criminosa. A operação, batizada de Sem Desconto, expôs a vulnerabilidade de idosos, especialmente em áreas rurais, onde o acesso à tecnologia é limitado.

O esquema envolveu associações e sindicatos que, sob a fachada de oferecer serviços como assistência jurídica e descontos em saúde, realizavam cobranças não autorizadas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários. A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou que 97,6% dos aposentados entrevistados não autorizaram os descontos. A operação resultou na suspensão de Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com 11 entidades investigadas e no afastamento de servidores do INSS, incluindo o ex-presidente Alessandro Stefanutto.

Os números impressionam e revelam a escala do problema:

  • Prejuízo total estimado: R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
  • Aposentados rurais: 67% das vítimas, com R$ 2,87 bilhões desviados.
  • Aposentados urbanos: 33% das vítimas, com perdas proporcionais menores.
  • Entidades investigadas: 11 associações, com suspeitas sobre outras 20.

A gravidade do caso levou o governo a suspender todos os descontos associativos e prometeu ressarcir os valores cobrados indevidamente. A investigação, iniciada em 2023 pela CGU, ganhou força com a operação deflagrada em 23 de abril de 2025, que envolveu 211 mandados de busca e apreensão e seis prisões temporárias em 13 estados e no Distrito Federal.

Origem do esquema fraudulento

A fraude teve início em 2019, durante o governo Bolsonaro, quando os Acordos de Cooperação Técnica começaram a ser firmados em maior volume. Esses acordos permitiam que entidades associativas descontassem mensalidades diretamente dos benefícios, desde que houvesse autorização expressa dos aposentados. No entanto, a ausência de controles rigorosos e a possibilidade de falsificação de assinaturas abriram brechas para a ação criminosa. Em 2020, um decreto alterou as regras, exigindo autorização prévia e específica, mas as falhas de fiscalização persistiram.

A CGU constatou que muitas entidades não entregavam a documentação exigida para validar os descontos. Em 72% dos casos analisados, as associações não apresentaram os comprovantes necessários. Algumas, como a Caixa de Assistência dos Aposentados e Pensionistas do INSS (Caap), realizaram centenas de descontos irregulares, com 214 dos 215 casos auditados considerados indevidos. A falta de estrutura operacional dessas entidades também chamou a atenção: muitas não possuíam escritórios ou serviços reais, funcionando como fachadas para o desvio de recursos.

A investigação revelou que o esquema se intensificou a partir de 2023, já no governo Lula, quando os descontos associativos triplicaram, passando de R$ 706,2 milhões em 2022 para R$ 2,8 bilhões em 2024. A CGU identificou um aumento súbito no número de reclamações, com 192 mil pedidos de cancelamento de descontos registrados em abril de 2024. A demora do INSS em adotar medidas efetivas, mesmo após alertas, agravou a situação.

Vulnerabilidade dos aposentados rurais

Os aposentados da zona rural foram os mais afetados devido a barreiras específicas que dificultam o acompanhamento de seus benefícios. A falta de acesso à internet e a baixa familiaridade com plataformas digitais, como o aplicativo Meu INSS, deixaram esses beneficiários expostos. Muitos só percebiam os descontos ao consultar o contracheque, mas enfrentavam dificuldades para registrar reclamações ou bloquear as cobranças.

A CGU entrevistou 1.273 beneficiários entre abril e julho de 2024, em todas as unidades da federação. Os resultados mostram a gravidade do problema:

  • 97,6% dos entrevistados não autorizaram os descontos.
  • 95,9% afirmaram não participar de nenhuma associação.
  • 70% das entidades auditadas não apresentaram documentação válida.
  • A maioria das vítimas rurais é analfabeta ou tem baixa escolaridade.

A operação da Polícia Federal destacou que assinaturas de idosos com doenças incapacitantes e até de analfabetos foram fraudadas. Em muitos casos, os descontos eram pequenos, variando de R$ 10 a R$ 50 por mês, o que dificultava a percepção imediata do golpe. No entanto, a soma desses valores resultou em um prejuízo bilionário, afetando milhões de aposentados.

Ação da Polícia Federal e CGU

A operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril de 2025, marcou um ponto de virada na investigação. Cerca de 700 policiais federais e 80 servidores da CGU cumpriram 211 mandados de busca e apreensão em 34 municípios. A ação resultou na apreensão de R$ 41 milhões em bens, incluindo carros de luxo, joias, obras de arte e R$ 1,734 milhão em dinheiro vivo. Seis pessoas foram presas temporariamente, e cinco servidores do INSS, além de um policial federal, foram afastados.

A Polícia Federal identificou que o esquema contava com a participação de “funcionários laranjas” e movimentava milhões de reais por mês. Alessandro Stefanutto, então presidente do INSS, foi demitido no mesmo dia da operação. Outros servidores afastados incluíam o procurador-geral do INSS, Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, e o diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão, Vanderlei Barbosa dos Santos. A investigação ainda apura o grau de envolvimento de cada agente.

A CGU, por sua vez, realizou auditorias em 29 das 31 entidades suspeitas. O relatório apontou que 21 delas tinham 100% dos descontos considerados irregulares, enquanto outras sete apresentavam índices entre 71% e 99%. A operação também revelou que o INSS ignorou seis alertas de órgãos de controle, permitindo que o esquema continuasse a crescer.

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rafastockbr/shutterstock.com

Entidades investigadas

Pelo menos 11 entidades associativas foram alvos de medidas judiciais, e outras 20 estão sob suspeita. Essas organizações formalizavam Acordos de Cooperação Técnica com o INSS, mas muitas não cumpriam as exigências legais. Algumas entidades prometiam serviços como auxílio jurídico, descontos em academias e planos de saúde, mas não tinham infraestrutura para entregá-los.

Entre as entidades investigadas, destacam-se:

  • Ambec: Suspeita de 87 descontos indevidos.
  • AAPB: Realizou 82 descontos sem autorização.
  • Unabrasil: Acusada de 72 descontos irregulares.
  • Caap: 214 dos 215 descontos auditados foram considerados fraudulentos.
  • Sindnapi: Vice-presidida por José Ferreira da Silva, irmão do presidente Lula, nega irregularidades.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) também está entre as investigadas, apesar de ter solicitado, em 2024, o desbloqueio em lote de descontos, contrariando normas do INSS. A suspensão dos ACTs dessas entidades foi uma das primeiras medidas tomadas pelo governo após a operação.

Impacto nas vítimas urbanas

Embora os aposentados rurais sejam a maioria, os beneficiários urbanos representam 33% das vítimas, com prejuízos proporcionais ao total de R$ 6,3 bilhões. Diferentemente das áreas rurais, os aposentados urbanos têm maior acesso a canais digitais, mas muitos foram enganados por campanhas de filiação fraudulentas. A falsificação de assinaturas e a falta de verificação rigorosa das autorizações também afetaram esse grupo.

Em áreas urbanas, as entidades investigadas usavam estratégias como ligações telefônicas e propagandas enganosas para atrair associados. Muitos aposentados relataram dificuldades para bloquear os descontos, mesmo após identificarem as cobranças. A Central 135, principal canal de atendimento do INSS, recebeu milhares de reclamações, mas a lentidão na resolução dos casos frustrou os beneficiários.

A CGU constatou que, em 2024, o número de pedidos de revisão de descontos atingiu 190 mil, um aumento significativo em relação aos 22 mil registrados em julho de 2023. A operação da Polícia Federal revelou que algumas entidades continuaram a operar mesmo após denúncias, aproveitando a burocracia do INSS.

Medidas de proteção aos beneficiários

O governo anunciou a suspensão de todos os descontos associativos e a criação de mecanismos para ressarcir as vítimas. Os aposentados que identificarem cobranças indevidas podem solicitar a exclusão do débito pelo aplicativo Meu INSS ou pela Central 135. O processo, no entanto, exige acesso a login Gov.br e consulta ao extrato de benefício, o que pode ser um obstáculo para idosos rurais.

Para bloquear os descontos, os beneficiários devem:

  • Acessar o Meu INSS e consultar o extrato de pagamento.
  • Identificar mensalidades associativas não autorizadas.
  • Solicitar a exclusão do débito no aplicativo ou pela Central 135.
  • Registrar reclamações no Portal Consumidor.gov ou na Ouvidoria do INSS.
  • Contatar a entidade responsável pelo desconto para exigir o estorno.

O INSS também passou a exigir assinatura eletrônica avançada e biometria para novos descontos, com implementação do sistema biométrico da Dataprev em fevereiro de 2025. Essas medidas visam aumentar a segurança, mas ainda enfrentam desafios para alcançar os beneficiários rurais.

Falhas de fiscalização do INSS

A investigação apontou que o INSS foi omisso ao ignorar alertas de órgãos de controle. Desde 2019, o Tribunal de Contas da União (TCU) já indicava falhas nos controles dos Acordos de Cooperação Técnica. Em 2023, o Sindnapi, por meio de sua coordenadora jurídica, denunciou irregularidades ao Conselho Nacional da Previdência Social, mas as medidas demoraram a ser implementadas.

A Polícia Federal revelou que o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, autorizou o desbloqueio em lote de descontos em 2024, contrariando pareceres da Procuradoria Federal. A direção do INSS também assinou novos acordos com entidades suspeitas, mesmo após o início das investigações. A CGU apontou que a falta de capacidade operacional do INSS para monitorar os ACTs contribuiu para o crescimento do esquema.

Em resposta, o governo anunciou a indicação de um novo presidente para o INSS, a ser escolhido diretamente pelo presidente Lula. O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, negou omissão, mas reconheceu a demora na adoção de medidas efetivas. A exoneração de André Fidelis, ex-diretor de Benefícios, em maio de 2024, foi uma das ações tomadas após denúncias de letargia.

Repercussão política

O escândalo gerou forte repercussão no Congresso Nacional, com a oposição protocolando, em 30 de abril de 2025, um pedido para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). O Partido Liberal (PL) argumenta que a fraude, embora iniciada em 2019, cresceu significativamente no governo Lula, com 60% dos descontos realizados nos últimos dois anos. Parlamentares governistas, por sua vez, destacam que a investigação só avançou na atual gestão.

A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) protocolou uma indicação solicitando a abertura de um crédito extraordinário de R$ 6,3 bilhões para ressarcir as vítimas. O recurso, segundo a parlamentar, seria destinado a mitigar os danos materiais e psicológicos causados pelo esquema. A proposta ainda está em análise pelo governo federal.

A presença de José Ferreira da Silva, conhecido como Frei Chico, irmão do presidente Lula, como vice-presidente do Sindnapi, também alimentou debates políticos. A entidade nega irregularidades e afirma que atua com transparência, mas a relação familiar gerou críticas da oposição.

Aumento dos descontos

Os descontos associativos cresceram exponencialmente nos últimos anos, segundo a CGU. Em 2021, o total foi de R$ 536,3 milhões, subindo para R$ 1,3 bilhão em 2023 e com projeção de R$ 2,6 bilhões em 2024, antes da suspensão dos ACTs. A investigação revelou que o aumento foi impulsionado pela facilidade de falsificar autorizações e pela falta de verificação biométrica.

Entre janeiro de 2023 e março de 2025, mais de 3,5 milhões de descontos não reconhecidos foram registrados. A CGU destacou que muitas entidades usavam empresas terceirizadas para captar associados, o que aumentava o risco de fraudes. A Ambec, por exemplo, atribuiu os descontos indevidos a “erros de afiliação” cometidos por terceiros, prometendo ressarcir os valores em dobro.

A Polícia Federal também identificou movimentações financeiras suspeitas, com entidades transferindo milhões de reais para contas de pessoas físicas e empresas ligadas aos investigados. A apreensão de bens, como carros de luxo e joias, reforça a suspeita de enriquecimento ilícito.

Medidas preventivas

Para evitar novas fraudes, o INSS implementou mudanças nas regras de descontos associativos. A Instrução Normativa 162, publicada em 14 de março de 2024, condicionou novos descontos à adoção de tecnologias de assinatura eletrônica avançada e biometria. A Dataprev, responsável pela gestão de dados do INSS, passou a testar o sistema biométrico em maio de 2024, com implementação total em fevereiro de 2025.

Os beneficiários agora podem bloquear descontos diretamente no Meu INSS, mas o processo ainda exige acesso digital. Para os aposentados rurais, o governo estuda parcerias com agências do INSS e prefeituras para facilitar o atendimento presencial. A Central 135 também foi reforçada para atender às reclamações, mas a alta demanda tem gerado filas e atrasos.

A CGU recomendou a revisão de todos os ACTs firmados desde 2019 e a criação de um sistema de monitoramento em tempo real para identificar descontos suspeitos. A Polícia Federal, por sua vez, continua investigando possíveis ramificações do esquema, incluindo a participação de servidores públicos e empresas privadas.

Perfil das vítimas

A maioria das vítimas é composta por idosos com mais de 60 anos, muitos dos quais dependem exclusivamente do benefício do INSS para sobreviver. Na zona rural, a prevalência de analfabetismo e a falta de acesso à internet dificultaram a identificação dos descontos. Em áreas urbanas, os aposentados foram alvos de campanhas enganosas, com promessas de benefícios inexistentes.

A CGU constatou que muitos beneficiários só perceberam os descontos após meses ou anos, devido ao valor relativamente baixo das mensalidades. Em alguns casos, as vítimas tentaram bloquear as cobranças, mas enfrentaram barreiras burocráticas. A operação Sem Desconto revelou que o esquema explorava a vulnerabilidade social e econômica dos aposentados, especialmente em regiões mais pobres.

A Polícia Federal também identificou que o esquema afetou pensionistas e beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC), ampliando o alcance do prejuízo. A investigação segue para determinar o número exato de vítimas e o valor total desviado.

Ações judiciais

A Justiça Federal autorizou a operação Sem Desconto e determinou o sequestro de bens no valor de R$ 1 bilhão. A Polícia Federal continua analisando documentos apreendidos para identificar outros envolvidos. Até o momento, cinco pessoas permanecem presas, e uma está foragida. A investigação também apura a participação de um policial federal que teria dado suporte ao grupo.

Os beneficiários prejudicados podem buscar ressarcimento diretamente com as entidades responsáveis, mas muitas não oferecem canais de atendimento confiáveis. O INSS orienta que as reclamações sejam registradas no Portal Consumidor.gov ou na Ouvidoria, mas o processo de estorno pode levar meses. A CGU estima que o ressarcimento total dependerá da recuperação dos bens apreendidos e da responsabilização das entidades.

A operação também gerou ações civis públicas, com pedidos de indenização coletiva para as vítimas. O Ministério Público Federal acompanha o caso e avalia a possibilidade de novas medidas judiciais contra o INSS por omissão.

Papel das associações

As associações investigadas usavam a promessa de benefícios atraentes para captar associados, mas muitas não entregavam os serviços anunciados. A Polícia Federal constatou que algumas entidades operavam com endereços fictícios ou sem qualquer estrutura física. A Caap, por exemplo, não disponibilizava telefone ou e-mail para contato, dificultando reclamações.

A Ambec, uma das 11 entidades alvos, afirmou que os descontos indevidos resultaram de erros cometidos por empresas terceirizadas. A Unabrasil, por sua vez, destacou que possui um programa de compliance e negou irregularidades. O Sindnapi, ligado ao irmão do presidente Lula, afirmou que sempre atuou com autorizações formais e apoiou as investigações.

A CGU recomendou que o INSS revise os critérios para firmar novos ACTs, exigindo maior transparência das entidades. A suspensão dos acordos vigentes foi prorrogada até a conclusão das investigações, mas o governo ainda não definiu como serão tratados os contratos futuros.

Reuniões com entidades suspeitas

O Poder360 revelou que, entre janeiro de 2023 e março de 2025, representantes do governo federal se reuniram 15 vezes com entidades investigadas. Os encontros ocorreram nos ministérios da Previdência Social, do Desenvolvimento Social e no próprio INSS. O levantamento considerou apenas reuniões registradas oficialmente, mas outros encontros podem ter ocorrido sem registro.

Os compromissos envolveram discussões sobre benefícios previdenciários e assistenciais, incluindo o BPC. A frequência dos encontros, com oito em 2023, cinco em 2024 e dois em 2025, levantou questionamentos sobre a proximidade entre o governo e as entidades suspeitas. A CGU destacou que a falta de controles internos facilitou a continuidade do esquema, mesmo após denúncias.

A investigação também apura se houve favorecimento político nas negociações com as entidades. A presença de figuras ligadas ao governo, como o vice-presidente do Sindnapi, intensificou o debate sobre a transparência nas relações entre o INSS e as associações.

Propostas de reparação

A proposta de Fernanda Melchionna para um crédito extraordinário de R$ 6,3 bilhões ainda não foi avaliada pelo governo. A medida, se aprovada, seria usada para ressarcir os beneficiários e oferecer apoio psicológico às vítimas. A CGU estima que o processo de reparação será complexo, devido ao grande número de aposentados afetados e à dificuldade de rastrear os valores desviados.

O INSS anunciou que está revisando os extratos de pagamento de todos os beneficiários para identificar descontos indevidos. A prioridade é garantir o estorno automático para os casos confirmados, mas a implementação depende de sistemas digitais que ainda não alcançam todos os aposentados. O governo também estuda a criação de um fundo emergencial para atender as vítimas mais vulneráveis.

A Polícia Federal continua investigando as contas bancárias das entidades e dos servidores envolvidos. A recuperação dos R$ 41 milhões em bens apreendidos será destinada, em parte, ao ressarcimento dos beneficiários. No entanto, a CGU alerta que o valor total desviado pode ser maior do que o estimado, devido à falta de controles precisos no INSS.

Avanços na segurança digital

A implementação do sistema biométrico da Dataprev é uma das principais apostas para evitar novas fraudes. O sistema, testado desde maio de 2024, passou a ser obrigatório em fevereiro de 2025 para todos os descontos associativos. A tecnologia exige validação por reconhecimento facial ou impressão digital, reduzindo o risco de falsificações.

O INSS também lançou campanhas de conscientização para orientar os beneficiários sobre como consultar o extrato de pagamento e identificar cobranças suspeitas. As ações incluem parcerias com rádios comunitárias e lideranças locais nas áreas rurais, visando alcançar os idosos mais isolados. Apesar dos avanços, a dependência de canais digitais ainda é um obstáculo para muitos aposentados.

A CGU recomendou a criação de um canal de atendimento exclusivo para denúncias de fraudes, com equipes treinadas para orientar os beneficiários. O INSS estuda a proposta, mas a implementação depende de recursos adicionais e de mudanças na estrutura do órgão.

Cronologia do escândalo

A fraude no INSS seguiu uma trajetória marcada por falhas de fiscalização e aumento progressivo dos descontos. Os principais marcos incluem:

  • 2019: Início dos Acordos de Cooperação Técnica em maior volume, sob o governo Bolsonaro.
  • 2020: Decreto nº 10.410 exige autorização prévia para descontos, mas controles seguem frágeis.
  • 2023: CGU inicia investigações após aumento de reclamações; Sindnapi denuncia irregularidades.
  • Abril de 2024: 192 mil pedidos de cancelamento de descontos registrados.
  • 23 de abril de 2025: Operação Sem Desconto é deflagrada, com prisões e apreensões.

A investigação revelou que o esquema se aproveitou de brechas regulatórias e da vulnerabilidade dos beneficiários. A CGU estima que, sem a operação, os descontos poderiam atingir R$ 2,6 bilhões em 2024. A suspensão dos ACTs e a prisão dos envolvidos marcaram o início de uma resposta mais contundente ao problema.

Próximos passos da investigação

A Polícia Federal planeja novas fases da operação Sem Desconto, com foco na identificação de outros servidores e empresas envolvidas. A análise dos documentos apreendidos deve revelar o fluxo financeiro do esquema e possíveis conexões com agentes externos. A CGU, por sua vez, prepara um relatório final com recomendações para reformar o sistema de descontos associativos do INSS.

O Congresso Nacional acompanha o caso de perto, com a possibilidade de abertura de uma CPI ainda em 2025. A pressão por transparência e punição dos responsáveis cresce, especialmente entre os parlamentares da oposição. O governo, por sua vez, busca acelerar o ressarcimento das vítimas para minimizar o desgaste político.

A investigação também deve esclarecer o papel de empresas terceirizadas, que atuavam como intermediárias na captação de associados. A CGU identificou que essas empresas recebiam comissões por cada desconto realizado, o que incentivava a prática de fraudes. A responsabilização dessas organizações será um dos focos das próximas etapas.







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