Conheça a guru japonesa da organização, antes de Kondo – 05/02/2025 – Equilíbrio
Antes que Marie Kondo ganhasse a atenção do mundo com suas exortações para nos livrarmos de itens que não “despertam a alegria”, havia outra guru japonesa da organização doméstica: Hideko Yamashita, de 70 anos. Embora nunca tenha alcançado o nível de fama impulsionado pela Netflix que Kondo desfruta, muitos no Japão a consideram pioneira do movimento moderno de organização da casa –ou, como agora é conhecido no exterior, “método Kondo”.
As duas mulheres, nascidas em Tóquio com uma diferença de três décadas, compartilham a ideia de que uma família acumula coisas em excesso. Argumentam que deixar de lado os itens desnecessários para criar espaços minimalistas e mais arrumados pode melhorar o bem-estar mental. Yamashita disse que admira Kondo, de 40 anos, por levar essas ideias ao mundo ocidental. Um porta-voz de Kondo reconheceu em uma declaração que Yamashita tem sido uma figura líder na tendência de organização há anos, mas afirmou que Kondo estabeleceu filosofias próprias.
Há mais de duas décadas, Yamashita começou a ministrar seminários no Japão sobre danshari, a arte japonesa de organizar. Em 2009, seu livro “The New Tidying Up Method: Danshari” (O novo método de organização: danshari, em tradução livre) –publicado mais de um ano antes de “A Mágica da Arrumação” de Kondo chegar às prateleiras– a levou à fama. Apresenta um programa de TV semanal de grande audiência no Japão, ocupando-se de algumas das casas mais maximalistas do país.
Também dirige uma escola em que treina estudantes –sobretudo mulheres de meia-idade ou mais velhas– para que se tornem profissionais em organização. Quando faz consultas de danshari, transita com naturalidade pela casa de seus clientes, vestindo um elegante avental de um ombro só com uma faixa vermelha. Com seu cabelo castanho curto e perfeitamente arrumado e um sorriso caloroso e um pouco torto, a septuagenária irradia energia.
Yamashita e Kondo abordam a organização de maneiras diferentes. Nos livros e na série da Netflix, Kondo oferece técnicas fáceis de seguir para organizar, acompanhadas de alegria e positividade características. Ela ensina: mantenha os objetos que fazem você feliz e agradeça aos que não cumprem essa função antes de se desfazer deles.
Yamashita é mais abstrata, filosófica e introspectiva –menos acessível, argumentam os adeptos da escola de Kondo. Ao decidir o que manter ou descartar, Yamashita incentiva seus clientes a refletir sobre o apego a certos objetos e a examinar como o excesso e a obsessão afetam seu estado emocional.
“Para mim, o danshari não tem a ver com arrumar, organizar ou descartar coisas que não despertam a alegria. Trata-se de trazer as pessoas de volta a um estado em que se desfazer das coisas é algo natural. Quando a casa e a mente de alguém ficam entupidas com muitas coisas, começam a se deteriorar. É como comer e depois eliminar; faz parte da nossa existência. O danshari trata de criar um fluxo de saída e recuperar esse equilíbrio”, diz Yamashita, saboreando um macarrão soba com caldo de gergelim em um restaurante em Tóquio.
Yamashita teve o primeiro contato com o danshari na época da universidade, em Tóquio, quando estudou ioga e ensinamentos budistas que enfatizavam o desapego. Depois de se formar e se mudar para a província de Ishikawa, a oeste de Tóquio, começou a aplicar esses princípios na organização da própria casa, onde morava com o marido, o filho e a sogra –com a qual descobriu a dificuldade de incentivar os outros a eliminar o excesso de coisas.
Quando Yamashita tentava descartar as coisas, a sogra vasculhava os sacos de lixo, repreendendo-a com “mottainai” – termo japonês que expressa arrependimento pelo desperdício. Ela reclamava que a casa era pequena demais. “Eu queria gritar: ‘Você teria mais espaço se se livrasse das coisas!'”, lembra ela.
Em 2005, Yamashita, então com 50 anos, construiu outro prédio perto de sua casa, chamando-o de “Casa Aberta Danshari”. Lá, começou a orientar seus alunos de ioga sobre os princípios da organização doméstica. Quatro anos depois, publicou seu livro –sucesso instantâneo que foi seguido por dezenas de outros, que, no total, venderam mais de sete milhões de exemplares.
Tomoko Ikari, professora associada de comportamento do consumidor na Universidade Meisei, em Tóquio, explica que há uma razão para o danshari ter ressoado de maneira tão intensa no Japão: a ideia de viver com simplicidade e se desapegar dos desejos está profundamente enraizada nos ensinamentos budistas que ajudaram a formar o país.
Mas, apesar da imagem popular de lares japoneses organizados e estilos de vida enraizados em uma estética minimalista zen, o Japão é um país de espaço limitado, com uma concentração alta de pessoas em cidades grandes. Muitas casas são pequenas e abarrotadas de pertences, explica Ikari. “Alguns conheciam o danshari, mas eram poucos antes da ascensão de Yamashita. Anos depois, o que começou com ela reverberou no fenômeno global de ‘despertar a alegria’ que vemos hoje.”
Certa manhã, no início do outono passado, Yamashita chegou para uma consulta de danshari em um apartamento pequeno no oitavo andar de um prédio discreto no noroeste de Tóquio. Sua equipe de vídeo a acompanhou para gravar a sessão para seu canal no YouTube. Vestida com jeans azul-claro e uma blusa branca com babados, percorreu o corredor de entrada até a sala principal, parando para observar a cena diante dela. Torres de sacolas, cestos e baús transbordavam roupas e brinquedos. Em um canto, dezenas de garrafas empoeiradas estavam atrás de pufes, e um minitrampolim estava jogado ao lado.
Praticamente nenhuma superfície estava visível sob as pilhas de aparelhos antigos, porta-retratos e materiais de escritório. “Isso aqui não parece muito refrescante, né? Você pretende deixar isso mais arejado?”, pergunta Yamashita, sorrindo ao se virar para Risa Kojima, dona do apartamento, que a observava da sala com os olhos arregalados.
Kojima, de 41 anos, e seu marido, Takashi, trabalham em tempo integral e têm três filhos – um bebê, um na pré-escola e um no ensino fundamental. Além de seu trabalho diário, Kojima se divide entre atividades paralelas, como a fotografia e a organização de eventos. Seu marido cuida da maior parte das tarefas domésticas e da criação das crianças. Uma década depois da mudança, fazia tanto tempo que o apartamento de 70 metros quadrados do casal estava em desordem que eles já nem notavam a bagunça.
Iniciando pela sala de estar, Kojima e o marido começaram a arrumar alguns cestos cheios de canetas velhas, videogames e emaranhados de cabos de carregadores. Yamashita circulava pelo cômodo com seu avental característico, limpando as superfícies e bombardeando o casal com perguntas. Uma das primeiras – “O que é mais importante para vocês: o conforto desse espaço ou o apego a esses objetos? O que tem mais valor?” – pegou Kojima de surpresa, deixando-a sem palavras.
No fim da sessão de cinco horas, como costuma ser o caso no programa de TV de Yamashita, Kojima havia encontrado algumas respostas. “Você está percebendo que há coisas demais à vista, mas precisamos ir mais fundo para entender por que vocês têm tantos objetos”, disse Yamashita no meio da arrumação. “Acho que minha mente está desorganizada. Há tanta informação entrando na minha cabeça o tempo todo”, responde Kojima, referindo-se ao trabalho e a outras preocupações.
Yamashita insistiu: “Claro, ninguém pode ver o que se passa dentro da sua cabeça, mas dá para ver neste espaço.” Em seguida, apontou para a sala de estar: “Consegue enxergar como os desafios com que sua mente está lidando se manifestam de maneira física aqui?” Kojima responde: “Acho que o problema é que nem consigo perceber quando há coisas demais.”
Durante uma pausa entre as sessões da manhã e da tarde, Yamashita, acompanhada de sua equipe de vídeo e de Kojima, caminhou até um pequeno restaurante de lámen no fim da rua. Acomodando-se a uma mesa baixa em um canto do estabelecimento forrado de tatames, Yamashita comentou com Kojima como o danshari pode ser difícil.
“De muitas maneiras, encarar nossas coisas é como encarar a nós mesmos. Todos fazemos muitas coisas, e é difícil reduzir quando se trata de relacionamentos e trabalho”, afirma Yamashita. Seu objetivo, explicou, era ajudar essa mãe de três filhos a aprender a reconhecer quando as coisas estavam indo longe demais. “O que estamos fazendo com os itens da sua casa é só um treinamento.”
Antes que Marie Kondo ganhasse a atenção do mundo com suas exortações para nos livrarmos de itens que não “despertam a alegria”, havia outra guru japonesa da organização doméstica: Hideko Yamashita, de 70 anos. Embora nunca tenha alcançado o nível de fama impulsionado pela Netflix que Kondo desfruta, muitos no Japão a consideram pioneira do movimento moderno de organização da casa –ou, como agora é conhecido no exterior, “método Kondo”.
As duas mulheres, nascidas em Tóquio com uma diferença de três décadas, compartilham a ideia de que uma família acumula coisas em excesso. Argumentam que deixar de lado os itens desnecessários para criar espaços minimalistas e mais arrumados pode melhorar o bem-estar mental. Yamashita disse que admira Kondo, de 40 anos, por levar essas ideias ao mundo ocidental. Um porta-voz de Kondo reconheceu em uma declaração que Yamashita tem sido uma figura líder na tendência de organização há anos, mas afirmou que Kondo estabeleceu filosofias próprias.
Há mais de duas décadas, Yamashita começou a ministrar seminários no Japão sobre danshari, a arte japonesa de organizar. Em 2009, seu livro “The New Tidying Up Method: Danshari” (O novo método de organização: danshari, em tradução livre) –publicado mais de um ano antes de “A Mágica da Arrumação” de Kondo chegar às prateleiras– a levou à fama. Apresenta um programa de TV semanal de grande audiência no Japão, ocupando-se de algumas das casas mais maximalistas do país.
Também dirige uma escola em que treina estudantes –sobretudo mulheres de meia-idade ou mais velhas– para que se tornem profissionais em organização. Quando faz consultas de danshari, transita com naturalidade pela casa de seus clientes, vestindo um elegante avental de um ombro só com uma faixa vermelha. Com seu cabelo castanho curto e perfeitamente arrumado e um sorriso caloroso e um pouco torto, a septuagenária irradia energia.
Yamashita e Kondo abordam a organização de maneiras diferentes. Nos livros e na série da Netflix, Kondo oferece técnicas fáceis de seguir para organizar, acompanhadas de alegria e positividade características. Ela ensina: mantenha os objetos que fazem você feliz e agradeça aos que não cumprem essa função antes de se desfazer deles.
Yamashita é mais abstrata, filosófica e introspectiva –menos acessível, argumentam os adeptos da escola de Kondo. Ao decidir o que manter ou descartar, Yamashita incentiva seus clientes a refletir sobre o apego a certos objetos e a examinar como o excesso e a obsessão afetam seu estado emocional.
“Para mim, o danshari não tem a ver com arrumar, organizar ou descartar coisas que não despertam a alegria. Trata-se de trazer as pessoas de volta a um estado em que se desfazer das coisas é algo natural. Quando a casa e a mente de alguém ficam entupidas com muitas coisas, começam a se deteriorar. É como comer e depois eliminar; faz parte da nossa existência. O danshari trata de criar um fluxo de saída e recuperar esse equilíbrio”, diz Yamashita, saboreando um macarrão soba com caldo de gergelim em um restaurante em Tóquio.
Yamashita teve o primeiro contato com o danshari na época da universidade, em Tóquio, quando estudou ioga e ensinamentos budistas que enfatizavam o desapego. Depois de se formar e se mudar para a província de Ishikawa, a oeste de Tóquio, começou a aplicar esses princípios na organização da própria casa, onde morava com o marido, o filho e a sogra –com a qual descobriu a dificuldade de incentivar os outros a eliminar o excesso de coisas.
Quando Yamashita tentava descartar as coisas, a sogra vasculhava os sacos de lixo, repreendendo-a com “mottainai” – termo japonês que expressa arrependimento pelo desperdício. Ela reclamava que a casa era pequena demais. “Eu queria gritar: ‘Você teria mais espaço se se livrasse das coisas!'”, lembra ela.
Em 2005, Yamashita, então com 50 anos, construiu outro prédio perto de sua casa, chamando-o de “Casa Aberta Danshari”. Lá, começou a orientar seus alunos de ioga sobre os princípios da organização doméstica. Quatro anos depois, publicou seu livro –sucesso instantâneo que foi seguido por dezenas de outros, que, no total, venderam mais de sete milhões de exemplares.
Tomoko Ikari, professora associada de comportamento do consumidor na Universidade Meisei, em Tóquio, explica que há uma razão para o danshari ter ressoado de maneira tão intensa no Japão: a ideia de viver com simplicidade e se desapegar dos desejos está profundamente enraizada nos ensinamentos budistas que ajudaram a formar o país.
Mas, apesar da imagem popular de lares japoneses organizados e estilos de vida enraizados em uma estética minimalista zen, o Japão é um país de espaço limitado, com uma concentração alta de pessoas em cidades grandes. Muitas casas são pequenas e abarrotadas de pertences, explica Ikari. “Alguns conheciam o danshari, mas eram poucos antes da ascensão de Yamashita. Anos depois, o que começou com ela reverberou no fenômeno global de ‘despertar a alegria’ que vemos hoje.”
Certa manhã, no início do outono passado, Yamashita chegou para uma consulta de danshari em um apartamento pequeno no oitavo andar de um prédio discreto no noroeste de Tóquio. Sua equipe de vídeo a acompanhou para gravar a sessão para seu canal no YouTube. Vestida com jeans azul-claro e uma blusa branca com babados, percorreu o corredor de entrada até a sala principal, parando para observar a cena diante dela. Torres de sacolas, cestos e baús transbordavam roupas e brinquedos. Em um canto, dezenas de garrafas empoeiradas estavam atrás de pufes, e um minitrampolim estava jogado ao lado.
Praticamente nenhuma superfície estava visível sob as pilhas de aparelhos antigos, porta-retratos e materiais de escritório. “Isso aqui não parece muito refrescante, né? Você pretende deixar isso mais arejado?”, pergunta Yamashita, sorrindo ao se virar para Risa Kojima, dona do apartamento, que a observava da sala com os olhos arregalados.
Kojima, de 41 anos, e seu marido, Takashi, trabalham em tempo integral e têm três filhos – um bebê, um na pré-escola e um no ensino fundamental. Além de seu trabalho diário, Kojima se divide entre atividades paralelas, como a fotografia e a organização de eventos. Seu marido cuida da maior parte das tarefas domésticas e da criação das crianças. Uma década depois da mudança, fazia tanto tempo que o apartamento de 70 metros quadrados do casal estava em desordem que eles já nem notavam a bagunça.
Iniciando pela sala de estar, Kojima e o marido começaram a arrumar alguns cestos cheios de canetas velhas, videogames e emaranhados de cabos de carregadores. Yamashita circulava pelo cômodo com seu avental característico, limpando as superfícies e bombardeando o casal com perguntas. Uma das primeiras – “O que é mais importante para vocês: o conforto desse espaço ou o apego a esses objetos? O que tem mais valor?” – pegou Kojima de surpresa, deixando-a sem palavras.
No fim da sessão de cinco horas, como costuma ser o caso no programa de TV de Yamashita, Kojima havia encontrado algumas respostas. “Você está percebendo que há coisas demais à vista, mas precisamos ir mais fundo para entender por que vocês têm tantos objetos”, disse Yamashita no meio da arrumação. “Acho que minha mente está desorganizada. Há tanta informação entrando na minha cabeça o tempo todo”, responde Kojima, referindo-se ao trabalho e a outras preocupações.
Yamashita insistiu: “Claro, ninguém pode ver o que se passa dentro da sua cabeça, mas dá para ver neste espaço.” Em seguida, apontou para a sala de estar: “Consegue enxergar como os desafios com que sua mente está lidando se manifestam de maneira física aqui?” Kojima responde: “Acho que o problema é que nem consigo perceber quando há coisas demais.”
Durante uma pausa entre as sessões da manhã e da tarde, Yamashita, acompanhada de sua equipe de vídeo e de Kojima, caminhou até um pequeno restaurante de lámen no fim da rua. Acomodando-se a uma mesa baixa em um canto do estabelecimento forrado de tatames, Yamashita comentou com Kojima como o danshari pode ser difícil.
“De muitas maneiras, encarar nossas coisas é como encarar a nós mesmos. Todos fazemos muitas coisas, e é difícil reduzir quando se trata de relacionamentos e trabalho”, afirma Yamashita. Seu objetivo, explicou, era ajudar essa mãe de três filhos a aprender a reconhecer quando as coisas estavam indo longe demais. “O que estamos fazendo com os itens da sua casa é só um treinamento.”
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