Brasil vai entrar em recessão em 2025? Veja as apostas do mercado
Apesar do forte desempenho da economia brasileira nos dois primeiros anos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com crescimento de 2,9% em 2023 e projeções de alta de 3,5% em 2024, uma série de indicadores divulgados nos últimos meses retratam um movimento de desaceleração em diversos setores e reforçam em parte do mercado a percepção de que a maré está virando – e que o Brasil pode, no limite, entrar na chamada “recessão técnica” até o fim de 2025.
Pelo menos seis instituições financeiras – Bradesco, Banco BV, Ativa Investimentos, Monte Bravo, Nova Futura e Tendências – já apontam para um cenário de recessão técnica no segundo semestre deste ano. Tecnicamente, ela ocorre quando há dois trimestres consecutivos de queda do Produto Interno Bruto (PIB). Em outras palavras, o país teria uma perda no valor de seus bens e serviços por um período de pelo menos 6 meses.
Entenda
- De acordo com as estimativas do Bradesco, o PIB do país deve fechar 2025 com alta de 2,2%, o que representaria uma forte desaceleração em relação aos dois anos anteriores.
- O banco projeta uma recessão técnica entre o terceiro e o quatro trimestres, com duas quedas seguidas de 0,3%.
- A perspectiva de contração econômica a partir do terceiro trimestre é corroborada pela Tendências, que espera um recuo de 0,6% (entre julho e setembro) e 0,2% (entre outubro e dezembro).
- O BV, por sua vez, acredita que o PIB do país deve cair 0,5% no penúltimo trimestre e 1% no último trimestre de 2025.
- A Monte Bravo estima uma redução de 0,5% já no segundo trimestre, seguida por um novo recuo de 0,5% nos três meses seguintes.
Segundo Carlos Lopes, economista do BV, a recessão técnica do Brasil só não virá antes da segunda metade do ano por causa das excelentes perspectivas do agronegócio. A expectativa é a de que a safra de grãos, especialmente da soja, bata recorde no primeiro trimestre, o que impulsionará o PIB.
“É bem provável que aconteça uma recessão na segunda metade do ano. Embora esse processo já esteja acontecendo em alguns setores, como indústria e serviços, temos ainda uma ajuda muito grande do agronegócio, que terá uma produção espetacular no primeiro trimestre, o que ajuda o PIB. Outro fator é o mercado de trabalho, que, mesmo com alguns sinais de enfraquecimento, segue muito forte, com crescimento acelerado da renda. Isso tende a sustentar o consumo nos próximos meses”, explica Lopes.
Nessa quarta-feira (5/2), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que a produção industrial brasileira recuou pelo terceiro mês consecutivo em dezembro, com baixa de 0,3%. Ainda de acordo com o IBGE, as vendas do comércio varejista registraram queda de 0,4% em novembro, enquanto o volume de serviços cedeu 0,9% – ambos os resultados vieram piores do que os analistas esperavam.
Mesmo com o desemprego em níveis historicamente baixos para o Brasil, dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, mostram que o país fechou mais vagas formais em 2024 do que as projeções indicavam. Apenas em dezembro, foram cortados 535,5 mil postos de trabalho.
O reflexo desses indicadores é perceptível no Índice de Confiança Empresarial (ICE), da Fundação Getulio Vargas (FGV). Divulgado na última segunda-feira (3/2), ele recuou 1,8 ponto, chegando a 94,8 pontos, com a deterioração na percepção dos empresários tanto em relação à situação atual quanto nas expectativas para os próximos meses.
Juros nas alturas
Segundo os economistas ouvidos pela reportagem do Metrópoles, o aperto monetário levado a cabo pelo Banco Central (BC), com a sequência de quatro aumentos seguidos na taxa básica de juros (Selic), atualmente em 13,25% ao ano, é o principal fator para o desaquecimento da economia e pode intensificar a recessão técnica que entrou no radar dos analistas.
“Esse é o objetivo do BC. Quando deixa o país com uma taxa real de juro de cerca de 9% [taxa nominal da Selic descontada a inflação], que é um parâmetro completamente distorcido da nossa média histórica, o BC faz uma política monetária de contração, com uma trajetória restritiva de liquidez de crédito na economia. A recessão técnica é algo desejado pelo BC. Ele quer contrair a economia”, afirma Carla Beni, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) e conselheira do Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo (Corecon-SP).
“Quando uma empresa pega o Boletim Focus que saiu nesta semana, ela vai ver que, até 2027, não há nenhuma perspectiva de a Selic voltar a um patamar de um dígito. Essa empresa vai deixar de investir aqui. A economia é feita de trajetória e expectativa, e há uma sinalização de manutenção dessa taxa real de juros mais elevada até 2028, o que desestimula demais a parte da economia que produz bens e serviços”, prossegue a economista.
Beni observa que, em breve, o mercado de trabalho deve começar a ser mais duramente afetado por uma política monetária mais austera. “O investimento de hoje é o emprego de amanhã. Se você começa a contrair a economia, o desemprego vai começar a não cair mais a partir do segundo semestre, intensificando esse cenário no ano que vem. Outro grande problema é o custo financeiro do crédito. O brasileiro tem uma renda média baixa, o varejo depende muito do parcelamento, e estamos com um alto grau de endividamento da população. O bolso vai ficando curto”, afirma.
De acordo com a edição mais recente do Relatório Focus, do BC, os analistas do mercado financeiro projetam uma alta de 2,06% para o PIB do Brasil em 2025, confirmando a desaceleração. Para 2026, a estimativa é a de que o país cresça ainda menos (1,72%). Em 2027, a expansão seria ainda inferior a 2% (1,96%), chegando a 2% em 2028. A taxa Selic deve chegar a 15% ao ano em 2025.
Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, divulgada na terça-feira (4/2), o colegiado afirma que o cenário-base da economia para os próximos é de desaceleração da atividade, como consequência da elevação dos juros para combater a pressão inflacionária.
“Se o BC sinaliza que vai continuar subindo os juros, haverá cada vez menos pessoas dispostas a colocar dinheiro na produção. Para o segundo semestre, isso pode realmente ser um movimento mais forte de contração da economia”, emenda Carla Beni.
Crise de confiança e questão fiscal
Outro ponto considerado sensível pelo mercado é a desconfiança em relação ao efetivo compromisso do governo Lula com o equilíbrio fiscal. De acordo com relatório da Ativa Investimentos, o pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), no fim do ano passado, não foi suficiente para sinalizar ao mercado que é possível reorganizar as contas públicas. “Ajustes fiscais mais profundos e estruturais são indispensáveis para restaurar a credibilidade e a previsibilidade econômica”, diz a instituição.
No cenário externo, o novo governo de Donald Trump nos Estados Unidos e o temor acerca de uma possível guerra comercial entre algumas das maiores potências do mundo acabam adicionando ainda mais imprevisibilidade à equação econômica desenhada pelos analistas do mercado.
“A crise de confiança tem um peso grande. Ela não é uma crença, mas vem da observação dos números. Olhamos para as projeções de inflação e não vemos uma convergência para a meta nem para horizontes mais longos em que a conjuntura já não tem um peso tão grande. Também não se acredita que tenhamos uma estabilização da dívida pública até pelo menos 2033”, afirma Carlos Lopes, do BV.
A voz dissonante entre os economistas consultados pelo Metrópoles é a de Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) e um dos responsáveis pelo Monitor do PIB da FGV. Segundo ele, apesar da perda de confiança de parte do mercado no governo e do enorme desafio fiscal, a economia do país ainda está distante da recessão.
“É necessário olhar uma série de outros indicadores para além do PIB, como emprego e inflação. Nada aponta que estamos entrando ou vamos entrar em recessão. O quarto trimestre do ano passado, que terá os dados divulgados em março, deve continuar mostrando crescimento. O terceiro contra o segundo foi de crescimento também”, afirma.
“Especialmente nesses últimos anos, temos sido impactados por uma série de anúncios de que o mundo iria acabar. No primeiro ano do atual governo, estavam prevendo menos de 1% de crescimento e deu 2,9%. No segundo ano, começaram a falar em 1,5% e vai dar 3,5%. Fico irritado com o fato de que as pessoas preferem acreditar no desastre, embora não existam elementos que justifiquem isso”, conclui.
Apesar do forte desempenho da economia brasileira nos dois primeiros anos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com crescimento de 2,9% em 2023 e projeções de alta de 3,5% em 2024, uma série de indicadores divulgados nos últimos meses retratam um movimento de desaceleração em diversos setores e reforçam em parte do mercado a percepção de que a maré está virando – e que o Brasil pode, no limite, entrar na chamada “recessão técnica” até o fim de 2025.
Pelo menos seis instituições financeiras – Bradesco, Banco BV, Ativa Investimentos, Monte Bravo, Nova Futura e Tendências – já apontam para um cenário de recessão técnica no segundo semestre deste ano. Tecnicamente, ela ocorre quando há dois trimestres consecutivos de queda do Produto Interno Bruto (PIB). Em outras palavras, o país teria uma perda no valor de seus bens e serviços por um período de pelo menos 6 meses.
Entenda
- De acordo com as estimativas do Bradesco, o PIB do país deve fechar 2025 com alta de 2,2%, o que representaria uma forte desaceleração em relação aos dois anos anteriores.
- O banco projeta uma recessão técnica entre o terceiro e o quatro trimestres, com duas quedas seguidas de 0,3%.
- A perspectiva de contração econômica a partir do terceiro trimestre é corroborada pela Tendências, que espera um recuo de 0,6% (entre julho e setembro) e 0,2% (entre outubro e dezembro).
- O BV, por sua vez, acredita que o PIB do país deve cair 0,5% no penúltimo trimestre e 1% no último trimestre de 2025.
- A Monte Bravo estima uma redução de 0,5% já no segundo trimestre, seguida por um novo recuo de 0,5% nos três meses seguintes.
Segundo Carlos Lopes, economista do BV, a recessão técnica do Brasil só não virá antes da segunda metade do ano por causa das excelentes perspectivas do agronegócio. A expectativa é a de que a safra de grãos, especialmente da soja, bata recorde no primeiro trimestre, o que impulsionará o PIB.
“É bem provável que aconteça uma recessão na segunda metade do ano. Embora esse processo já esteja acontecendo em alguns setores, como indústria e serviços, temos ainda uma ajuda muito grande do agronegócio, que terá uma produção espetacular no primeiro trimestre, o que ajuda o PIB. Outro fator é o mercado de trabalho, que, mesmo com alguns sinais de enfraquecimento, segue muito forte, com crescimento acelerado da renda. Isso tende a sustentar o consumo nos próximos meses”, explica Lopes.
Nessa quarta-feira (5/2), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que a produção industrial brasileira recuou pelo terceiro mês consecutivo em dezembro, com baixa de 0,3%. Ainda de acordo com o IBGE, as vendas do comércio varejista registraram queda de 0,4% em novembro, enquanto o volume de serviços cedeu 0,9% – ambos os resultados vieram piores do que os analistas esperavam.
Mesmo com o desemprego em níveis historicamente baixos para o Brasil, dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, mostram que o país fechou mais vagas formais em 2024 do que as projeções indicavam. Apenas em dezembro, foram cortados 535,5 mil postos de trabalho.
O reflexo desses indicadores é perceptível no Índice de Confiança Empresarial (ICE), da Fundação Getulio Vargas (FGV). Divulgado na última segunda-feira (3/2), ele recuou 1,8 ponto, chegando a 94,8 pontos, com a deterioração na percepção dos empresários tanto em relação à situação atual quanto nas expectativas para os próximos meses.
Juros nas alturas
Segundo os economistas ouvidos pela reportagem do Metrópoles, o aperto monetário levado a cabo pelo Banco Central (BC), com a sequência de quatro aumentos seguidos na taxa básica de juros (Selic), atualmente em 13,25% ao ano, é o principal fator para o desaquecimento da economia e pode intensificar a recessão técnica que entrou no radar dos analistas.
“Esse é o objetivo do BC. Quando deixa o país com uma taxa real de juro de cerca de 9% [taxa nominal da Selic descontada a inflação], que é um parâmetro completamente distorcido da nossa média histórica, o BC faz uma política monetária de contração, com uma trajetória restritiva de liquidez de crédito na economia. A recessão técnica é algo desejado pelo BC. Ele quer contrair a economia”, afirma Carla Beni, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) e conselheira do Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo (Corecon-SP).
“Quando uma empresa pega o Boletim Focus que saiu nesta semana, ela vai ver que, até 2027, não há nenhuma perspectiva de a Selic voltar a um patamar de um dígito. Essa empresa vai deixar de investir aqui. A economia é feita de trajetória e expectativa, e há uma sinalização de manutenção dessa taxa real de juros mais elevada até 2028, o que desestimula demais a parte da economia que produz bens e serviços”, prossegue a economista.
Beni observa que, em breve, o mercado de trabalho deve começar a ser mais duramente afetado por uma política monetária mais austera. “O investimento de hoje é o emprego de amanhã. Se você começa a contrair a economia, o desemprego vai começar a não cair mais a partir do segundo semestre, intensificando esse cenário no ano que vem. Outro grande problema é o custo financeiro do crédito. O brasileiro tem uma renda média baixa, o varejo depende muito do parcelamento, e estamos com um alto grau de endividamento da população. O bolso vai ficando curto”, afirma.
De acordo com a edição mais recente do Relatório Focus, do BC, os analistas do mercado financeiro projetam uma alta de 2,06% para o PIB do Brasil em 2025, confirmando a desaceleração. Para 2026, a estimativa é a de que o país cresça ainda menos (1,72%). Em 2027, a expansão seria ainda inferior a 2% (1,96%), chegando a 2% em 2028. A taxa Selic deve chegar a 15% ao ano em 2025.
Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, divulgada na terça-feira (4/2), o colegiado afirma que o cenário-base da economia para os próximos é de desaceleração da atividade, como consequência da elevação dos juros para combater a pressão inflacionária.
“Se o BC sinaliza que vai continuar subindo os juros, haverá cada vez menos pessoas dispostas a colocar dinheiro na produção. Para o segundo semestre, isso pode realmente ser um movimento mais forte de contração da economia”, emenda Carla Beni.
Crise de confiança e questão fiscal
Outro ponto considerado sensível pelo mercado é a desconfiança em relação ao efetivo compromisso do governo Lula com o equilíbrio fiscal. De acordo com relatório da Ativa Investimentos, o pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), no fim do ano passado, não foi suficiente para sinalizar ao mercado que é possível reorganizar as contas públicas. “Ajustes fiscais mais profundos e estruturais são indispensáveis para restaurar a credibilidade e a previsibilidade econômica”, diz a instituição.
No cenário externo, o novo governo de Donald Trump nos Estados Unidos e o temor acerca de uma possível guerra comercial entre algumas das maiores potências do mundo acabam adicionando ainda mais imprevisibilidade à equação econômica desenhada pelos analistas do mercado.
“A crise de confiança tem um peso grande. Ela não é uma crença, mas vem da observação dos números. Olhamos para as projeções de inflação e não vemos uma convergência para a meta nem para horizontes mais longos em que a conjuntura já não tem um peso tão grande. Também não se acredita que tenhamos uma estabilização da dívida pública até pelo menos 2033”, afirma Carlos Lopes, do BV.
A voz dissonante entre os economistas consultados pelo Metrópoles é a de Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) e um dos responsáveis pelo Monitor do PIB da FGV. Segundo ele, apesar da perda de confiança de parte do mercado no governo e do enorme desafio fiscal, a economia do país ainda está distante da recessão.
“É necessário olhar uma série de outros indicadores para além do PIB, como emprego e inflação. Nada aponta que estamos entrando ou vamos entrar em recessão. O quarto trimestre do ano passado, que terá os dados divulgados em março, deve continuar mostrando crescimento. O terceiro contra o segundo foi de crescimento também”, afirma.
“Especialmente nesses últimos anos, temos sido impactados por uma série de anúncios de que o mundo iria acabar. No primeiro ano do atual governo, estavam prevendo menos de 1% de crescimento e deu 2,9%. No segundo ano, começaram a falar em 1,5% e vai dar 3,5%. Fico irritado com o fato de que as pessoas preferem acreditar no desastre, embora não existam elementos que justifiquem isso”, conclui.
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