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15 Apr 2025, Tue

'A inteligência artificial diagnosticou meu câncer antes dos médicos' — os riscos ao investigar doenças em plataformas de IA




Com a ajuda da IA, a social media Clarissa Benatti descobriu o tipo do tumor maligno e o melhor tratamento a ser seguido. Assim como ela, outras pessoas estão usando a ferramenta em busca de respostas rápidas. No entanto, é preciso ter cautela: sem supervisão médica, o uso da plataforma pode até mesmo colocar vidas em risco Durante a gravidez de sua segunda filha, a social media Clarissa Benatti, de 38 anos, percebeu nódulos crescendo na sua mama direita. O que poderia ser algo atribuído aos hormônios da gestação acabou se revelando um câncer. Mas o diagnóstico exato do tumor não veio de nenhum dos oito médicos pelos quais ela passou. Veio do ChatGPT.
“Fui em obstetra, cirurgião plástico, mastologista, fiz ultrassonografia, biópsia… Todos os profissionais que me examinaram diziam que não era câncer de mama. E eles estavam certos — não era câncer de mama, era um câncer na mama”, conta ela.
Leia também
Embora pareça apenas uma diferença de preposição, a distinção é fundamental. O câncer de mama se origina no tecido mamário. Já o linfoma é um tumor do sistema linfático que, no caso da social media, apareceu no seio, mas não se originou ali. Trata-se de algo raro, que contribuiu para o desafio no diagnóstico.
A mastologista que a acompanhava chegou a suspeitar de uma doença benigna de crescimento acelerado, e solicitou a biópsia apenas para confirmar essa hipótese. No dia do exame, Benatti soube que havia perdido a bebê. Enquanto ainda se recuperava do baque, veio o laudo, inconclusivo: o nódulo poderia ser carcinoma, linfoma Burkitt-like, infiltração leucêmica ou até outra coisa.
IA entra em cena
Benatti é social media de médicos e trabalha com inteligência artificial (IA) há mais de dois anos. Em meio ao luto, decidiu recorrer ao ChatGPT para tentar entender melhor o que estava acontecendo com seu corpo.
Eu relatei tudo: que tive uma mastopexia redutora 18 anos atrás, que os nódulos começaram a crescer na cicatriz da mama, depois se espalharam… Coloquei os dados do hemograma, o resultado da biópsia. E aí ele sugeriu três tipos de linfoma.”
Dias depois, a tomografia confirmou: era mesmo o tumor hematológico. Ao colocar o laudo da tomografia na plataforma, a IA foi ainda mais específica: indicou que poderia se tratar de um tipo de linfoma não-Hodgkin, o linfoma difuso de grandes células B (LDGCB) — algo que o exame histopatológico confirmaria.
Orientação sobre o tratamento
Mas a ajuda da IA não parou por aí. Quando chegou o momento de decidir o tratamento, a oncologista sugeriu o protocolo R-CHOP — o mais comum para LDGCB. Mas a social media, baseada nas orientações do ChatGPT, questionou:
“Eu falei: ‘meu tumor tem tripla mutação e é altamente agressivo. Não seria mais indicado o R-DA-EPOCH?’ A médica olhou melhor os exames e concordou. Se eu não tivesse tido essa informação, talvez estivesse seguindo um protocolo menos eficaz”, diz.
Benatti com a família, durante o tratamento do câncer
Arquivo pessoal
Segurança, não substituição
Apesar de celebrar o impacto da inteligência artificial em sua jornada terapêutica, ela é categórica: “o médico é indispensável. Mas o ChatGPT me deu segurança. Quando a médica indicou o mesmo tratamento que ele havia sugerido, não senti a necessidade de buscar uma segunda opinião”. Ela acredita que saber conversar com a IA foi essencial para chegar ao diagnóstico correto.
+ Saúde: Os cinco tipos de câncer mais comuns em mulheres: causas, prevenção e diagnóstico
Sua história viralizou no perfil @clarissa.benatti no Instagram, com mais de 1 milhão de visualizações. “Muita gente comentou que também teve ajuda da inteligência artificial para entender seus sintomas e buscar atendimento. Acho que a IA pode ser uma ferramenta complementar, tanto para o médico, quanto para o paciente”, afirma.
Uso da IA na saúde
A inteligência artificial vai ganhar cada vez mais espaço na área da saúde. Diferentemente do Google, onde a informação é dispersa e desorganizada, a IA apresenta respostas com mais lógica e clareza, o que a torna ainda mais atrativa para quem busca entender o próprio corpo.
Mas o grande trunfo da tecnologia está no que acontece por trás da consulta. “Você consegue, hoje, através de programação treinada com milhares de exames de imagem, mais precisão do que o olho humano. Isso melhora muito os diagnósticos”, afirma Juliano Rodrigues da Cunha, cirurgião oncológico e diretor de comunicação da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO).
Não é médico, é ferramenta
Apesar das vantagens, os riscos também existem. O principal deles é a confiança excessiva por parte do público leigo. A inteligência artificial não é capaz de interpretar sinais subjetivos, nem realizar exame físico, tampouco captar nuances emocionais ou contextuais de cada pessoa.
+ Saúde: Queda na mortalidade e casos mais cedo: o que revela novo estudo sobre o câncer de mama
“A sensibilidade do que está acontecendo com aquele paciente na nossa frente não pode ser avaliada por uma máquina. A resposta de uma IA não substitui uma consulta médica. Ela é uma ferramenta a mais, não um diagnóstico definitivo”, aponta Cunha.
Outro ponto crítico é o risco de atrasar diagnósticos importantes. Ao confiar apenas na IA, algumas pessoas podem negligenciar sintomas e perder o timing ideal para tratamento. “Se tratadas no início, muitas doenças têm altíssimas chances de cura. Atrasar isso com base em uma sugestão genérica da IA pode ser perigoso no caso de qualquer doença”, diz.
Se com o Google a automedicação já era um problema, com a IA a preocupação só aumenta. As orientações que surgem da IA podem ser mal interpretadas, e em vez de ajudar, podem agravar o quadro de saúde.
Além disso, há o risco de disseminação de informações falsas. “A gente tem que ter cuidado com as fake news. A IA precisa de treinamento adequado para entregar dados com base científica. Do contrário, pode espalhar orientações sem respaldo.”
Para Cunha, o segredo está no equilíbrio: aproveitar a tecnologia para ampliar o acesso à saúde e melhorar diagnósticos, sem abrir mão da escuta, da sensibilidade e do olhar clínico de um profissional de saúde.
A inteligência artificial é fundamental e vai ocupar um espaço cada vez mais importante na assistência à saúde. Mas ela não substitui o atendimento humanizado e clínico, que considera o que o paciente está realmente sentindo.”


Com a ajuda da IA, a social media Clarissa Benatti descobriu o tipo do tumor maligno e o melhor tratamento a ser seguido. Assim como ela, outras pessoas estão usando a ferramenta em busca de respostas rápidas. No entanto, é preciso ter cautela: sem supervisão médica, o uso da plataforma pode até mesmo colocar vidas em risco Durante a gravidez de sua segunda filha, a social media Clarissa Benatti, de 38 anos, percebeu nódulos crescendo na sua mama direita. O que poderia ser algo atribuído aos hormônios da gestação acabou se revelando um câncer. Mas o diagnóstico exato do tumor não veio de nenhum dos oito médicos pelos quais ela passou. Veio do ChatGPT.
“Fui em obstetra, cirurgião plástico, mastologista, fiz ultrassonografia, biópsia… Todos os profissionais que me examinaram diziam que não era câncer de mama. E eles estavam certos — não era câncer de mama, era um câncer na mama”, conta ela.
Leia também
Embora pareça apenas uma diferença de preposição, a distinção é fundamental. O câncer de mama se origina no tecido mamário. Já o linfoma é um tumor do sistema linfático que, no caso da social media, apareceu no seio, mas não se originou ali. Trata-se de algo raro, que contribuiu para o desafio no diagnóstico.
A mastologista que a acompanhava chegou a suspeitar de uma doença benigna de crescimento acelerado, e solicitou a biópsia apenas para confirmar essa hipótese. No dia do exame, Benatti soube que havia perdido a bebê. Enquanto ainda se recuperava do baque, veio o laudo, inconclusivo: o nódulo poderia ser carcinoma, linfoma Burkitt-like, infiltração leucêmica ou até outra coisa.
IA entra em cena
Benatti é social media de médicos e trabalha com inteligência artificial (IA) há mais de dois anos. Em meio ao luto, decidiu recorrer ao ChatGPT para tentar entender melhor o que estava acontecendo com seu corpo.
Eu relatei tudo: que tive uma mastopexia redutora 18 anos atrás, que os nódulos começaram a crescer na cicatriz da mama, depois se espalharam… Coloquei os dados do hemograma, o resultado da biópsia. E aí ele sugeriu três tipos de linfoma.”
Dias depois, a tomografia confirmou: era mesmo o tumor hematológico. Ao colocar o laudo da tomografia na plataforma, a IA foi ainda mais específica: indicou que poderia se tratar de um tipo de linfoma não-Hodgkin, o linfoma difuso de grandes células B (LDGCB) — algo que o exame histopatológico confirmaria.
Orientação sobre o tratamento
Mas a ajuda da IA não parou por aí. Quando chegou o momento de decidir o tratamento, a oncologista sugeriu o protocolo R-CHOP — o mais comum para LDGCB. Mas a social media, baseada nas orientações do ChatGPT, questionou:
“Eu falei: ‘meu tumor tem tripla mutação e é altamente agressivo. Não seria mais indicado o R-DA-EPOCH?’ A médica olhou melhor os exames e concordou. Se eu não tivesse tido essa informação, talvez estivesse seguindo um protocolo menos eficaz”, diz.
Benatti com a família, durante o tratamento do câncer
Arquivo pessoal
Segurança, não substituição
Apesar de celebrar o impacto da inteligência artificial em sua jornada terapêutica, ela é categórica: “o médico é indispensável. Mas o ChatGPT me deu segurança. Quando a médica indicou o mesmo tratamento que ele havia sugerido, não senti a necessidade de buscar uma segunda opinião”. Ela acredita que saber conversar com a IA foi essencial para chegar ao diagnóstico correto.
+ Saúde: Os cinco tipos de câncer mais comuns em mulheres: causas, prevenção e diagnóstico
Sua história viralizou no perfil @clarissa.benatti no Instagram, com mais de 1 milhão de visualizações. “Muita gente comentou que também teve ajuda da inteligência artificial para entender seus sintomas e buscar atendimento. Acho que a IA pode ser uma ferramenta complementar, tanto para o médico, quanto para o paciente”, afirma.
Uso da IA na saúde
A inteligência artificial vai ganhar cada vez mais espaço na área da saúde. Diferentemente do Google, onde a informação é dispersa e desorganizada, a IA apresenta respostas com mais lógica e clareza, o que a torna ainda mais atrativa para quem busca entender o próprio corpo.
Mas o grande trunfo da tecnologia está no que acontece por trás da consulta. “Você consegue, hoje, através de programação treinada com milhares de exames de imagem, mais precisão do que o olho humano. Isso melhora muito os diagnósticos”, afirma Juliano Rodrigues da Cunha, cirurgião oncológico e diretor de comunicação da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO).
Não é médico, é ferramenta
Apesar das vantagens, os riscos também existem. O principal deles é a confiança excessiva por parte do público leigo. A inteligência artificial não é capaz de interpretar sinais subjetivos, nem realizar exame físico, tampouco captar nuances emocionais ou contextuais de cada pessoa.
+ Saúde: Queda na mortalidade e casos mais cedo: o que revela novo estudo sobre o câncer de mama
“A sensibilidade do que está acontecendo com aquele paciente na nossa frente não pode ser avaliada por uma máquina. A resposta de uma IA não substitui uma consulta médica. Ela é uma ferramenta a mais, não um diagnóstico definitivo”, aponta Cunha.
Outro ponto crítico é o risco de atrasar diagnósticos importantes. Ao confiar apenas na IA, algumas pessoas podem negligenciar sintomas e perder o timing ideal para tratamento. “Se tratadas no início, muitas doenças têm altíssimas chances de cura. Atrasar isso com base em uma sugestão genérica da IA pode ser perigoso no caso de qualquer doença”, diz.
Se com o Google a automedicação já era um problema, com a IA a preocupação só aumenta. As orientações que surgem da IA podem ser mal interpretadas, e em vez de ajudar, podem agravar o quadro de saúde.
Além disso, há o risco de disseminação de informações falsas. “A gente tem que ter cuidado com as fake news. A IA precisa de treinamento adequado para entregar dados com base científica. Do contrário, pode espalhar orientações sem respaldo.”
Para Cunha, o segredo está no equilíbrio: aproveitar a tecnologia para ampliar o acesso à saúde e melhorar diagnósticos, sem abrir mão da escuta, da sensibilidade e do olhar clínico de um profissional de saúde.
A inteligência artificial é fundamental e vai ocupar um espaço cada vez mais importante na assistência à saúde. Mas ela não substitui o atendimento humanizado e clínico, que considera o que o paciente está realmente sentindo.”



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